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authorSilvio Rhatto <rhatto@riseup.net>2017-03-05 16:22:57 -0300
committerSilvio Rhatto <rhatto@riseup.net>2017-03-05 16:22:57 -0300
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Updates books: metodo
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index 8a34349..b8e1b48 100644
--- a/books/filosofia/metodo.mdwn
+++ b/books/filosofia/metodo.mdwn
@@ -556,3 +556,116 @@ Sujeito (220):
possibilidade de comunicar-se com outrem.
-- 229
+
+### Estratégia e inteligência
+
+ Veremos cada vez melhor que as noções de arte, estratégia, inteligência,
+ bricolagem (estratégia organizadora de um novo objeto por conversão de antigos
+ objetos ou elementos da sua finalidade ou função) são intercomunicantes.
+
+ [...]
+
+ Quando programa tende a comandar, diminuir, suprimir as estratégias, a
+ obediência mecânica e míope torna-se modelo de comportamento. À escala humana,
+ a estratégia necessita de lucidez na elaboração e na conduta, jogo de
+ iniciativas e de responsabilidades, pleno emprego das competências individuais,
+ isto é, pleno emprego das qualidades do sujeito. Eis por que, entre
+ parênteses, o Método aqui procurado nunca será um programa, isto é, uma receita
+ preestabelecida, mas um convite e uma incitação à estratégia do pensamento.
+
+ -- 257
+
+### Liberdade
+
+* Definição, 258.
+* Suicídio, 259.
+
+### Sociedades: entidades de terceiro tipo
+
+ Não existe fronteira bem nítida entre as associações mais ou menos frouxas e as
+ sociedades rudimentares. Mas o que importa aqui é definir um fenômeno não na
+ sua fronteira incerta, mas na sua emergência própria. O fenômeno social emerge
+ quando as interações entre os indivíduos do segundo tipo produzem um todo
+ não-redutível aos indivíduos e que retroage sobre ele, isto é, quando se
+ constitui um sistema. Existe, portanto, sociedade quando as interações
+ comunicadoras/associativas constituem um todo organizado/organizador, que é
+ precisamente a sociedade, a qual, como toda a entidade de natureza sistêmica, é
+ dotada de qualidades emergentes e, com as suas qualidades, retroage enquanto
+ todo sobre os indivíduos, transformando-os em membros desta sociedade.
+
+ -- 264
+
+ O sistema social não é apenas um sistema: é uma organização que organiza
+ retroativamente a produção e a reprodução das interações que a produzem,
+ assegura a sua homeostasia através do turnover dos indivíduos que morrem e
+ nascem e, assim, continua a ser um ser-máquina autoprodutor e auto-organizador.
+
+ -- 265
+
+### Totalitarismo
+
+ Um novo e enorme poder de Estado tende a concentrar-se ao longo do século XX.
+
+ O Estado torna-se cada vez mais Estado-providência e Estado assistencial
+ (Welfare state). Num sentido, dedica-se cada vez mais à proteção e ao
+ bem-estar dos indivíduos, mas, ao mesmo tempo, estende as suas competências a
+ todos os domínios das vidas individuais, doravante encerradas numa rede
+ polimórfica, simultaneamente casulo (protetor mas eventualmente infantilizante)
+ e armadilha. Assim, desenvolve-se um Estado, de certo não totalitário, mas
+ totalizante, isto é, englobando todas as dimensões da existência humana.
+
+ Os notáveis desenvolvimentos informáticos, de que hoje se discutem as
+ ambivalências (Nora, Minc, 1978), deixam entrever espantosas possibilidades de
+ desconcentração comunicacionais e de que beneficiariam os indivíduos. Mas, ao
+ mesmo tempo, a informática dá a um aparelho de Estado central a possibilidade
+ de agrupar e tratar todas as informações acerca de um indivíduo de modo muito
+ mais ramificado e preciso que o controle neurocerebral sobre as células dos
+ nossos organismos. A partir daí, um código policial/tecnológico (munido de
+ dispositivos de detecção e de escuta em todos os terrenos) pode doravante
+ exercer-se sobre o desvio, anomalia, originalidade. A isto é necessário
+ acrescentar já as futuras ações bioquímicas sobre o espírito ----- cérebro
+ \____________/
+ humano, que permitirão estabelecer uma normalização generalizada de todo o
+ desvio. Doravante, o Estado encontra-se dotado de poderes que, virtualmente,
+ excedem todos os poderes de controle e de intervenção jamais concentrados.
+
+ Aqui mesmo, temos de inscrever o processo aparentemente marginal,
+ sociologicamente menor, que já constatei (Método I): o conhecimento científico
+ produz-se cada vez menos para ser pensado e meditado por espíritos humanos, mas
+ cada vez mais acumulado para a computação dos seus computadores, isto é, para a
+ utilização das entidades superindividuais, em primeiro lugar a entidade
+ supercompetente e onipresente: o Estado. Ao mesmo tempo e correlativamente,
+ essa ciência cega-nos: o resto do nosso mundo, da nossa sociedade, do nosso
+ destino é despedaçado por um conhecimento científico que, atualmente, ainda é
+ incapaz de pensar o indivíduo, incapaz de conceber a noção de sujeito, incapaz
+ de pensar a natureza da sociedade, incapaz de elaborar um pensamento que não
+ seja unicamente matematizado, formalizado, simplificador, mas, ao contrário,
+ muito capaz de fornecer aos poderes novas técnicas de controle, de manipulação,
+ de opressão, de terror, de destruição.
+
+ Ao aproximarmo-nos, pois, do momento em que podemos considerar que todos estes
+ processos conjuntos poderiam permitir ao ser do terceiro tipo realizar-se em
+ onipotência, não só sujeitando-nos e manipulando-nos, mas também
+ infantilizando-nos, irresponsabilizando-nos e despossuindo-nos da aspiração ao
+ conhecimento e do direito ao juízo.
+
+ Tal hipótese não é brincadeira intelectual, pois o Estado dedicado a essa
+ realização surgiu no século XX: o Estado totalitário. Instala-se, sob diversas
+ variantes, em todos os continentes, em todas as civilizações, em todas as
+ sociedades, sob o impulso, o controle, a apropriação de um aparelho soberano: o
+ partido detentor de todas as competências, possuidor de verdade sobre o homem,
+ a história, a natureza.
+
+ A partir daí, bastaria que este Estado totalitário concentrasse e utilizasse de
+ modo sistemático todas as formas de dominação/controle, não só burocráticas,
+ policiais, militares, mitológicas, políticas, mas também científicas, técnicas,
+ informáticas, bioquímicas, para que se pudesse operar uma sujeição das classes,
+ grupos, indivíduos, já não apenas generalizada mas irreversível; regressões dos
+ direitos individuais já não são apenas generalizadas mas irreversíveis.
+ Podemos, certamente, esperar que nossos totalitarismos contemporâneos sejam os
+ monstros provisórios nascidos das agonias e gestações deste século. Mas podemos
+ recear também que estes monstros se tornem duradouros na e pela
+ sujeição/controle estrutural dos indivíduos do segundo tipo e, por isso,
+ constituam os artesãos de um desenvolvimento decisivo do ser do terceiro tipo.
+
+ -- 281, 282