From b6c0ffcaf707ee1968a7f29021d20357692a84d0 Mon Sep 17 00:00:00 2001 From: Silvio Rhatto Date: Tue, 7 Aug 2018 10:05:58 -0300 Subject: Reorganization --- books/filosofia/contra-metodo.md | 98 ---- books/filosofia/cristal-fumaca.md | 487 ---------------- books/filosofia/espionosa-filosofia-pratica.md | 8 - books/filosofia/estoicismo.md | 79 --- books/filosofia/metodo.md | 24 - books/filosofia/metodo/1.md | 240 -------- books/filosofia/metodo/2.md | 744 ------------------------- books/filosofia/metodo/3.md | 140 ----- books/filosofia/metodo/4.md | 164 ------ books/filosofia/metodo/5.md | 24 - books/filosofia/metodo/6.md | 66 --- books/filosofia/metodo/tetragrama.dot | 8 - books/filosofia/metodo/tetragrama.svg | 57 -- 13 files changed, 2139 deletions(-) delete mode 100644 books/filosofia/contra-metodo.md delete mode 100644 books/filosofia/cristal-fumaca.md delete mode 100644 books/filosofia/espionosa-filosofia-pratica.md delete mode 100644 books/filosofia/estoicismo.md delete mode 100644 books/filosofia/metodo.md delete mode 100644 books/filosofia/metodo/1.md delete mode 100644 books/filosofia/metodo/2.md delete mode 100644 books/filosofia/metodo/3.md delete mode 100644 books/filosofia/metodo/4.md delete mode 100644 books/filosofia/metodo/5.md delete mode 100644 books/filosofia/metodo/6.md delete mode 100644 books/filosofia/metodo/tetragrama.dot delete mode 100644 books/filosofia/metodo/tetragrama.svg (limited to 'books/filosofia') diff --git a/books/filosofia/contra-metodo.md b/books/filosofia/contra-metodo.md deleted file mode 100644 index d37e60f..0000000 --- a/books/filosofia/contra-metodo.md +++ /dev/null @@ -1,98 +0,0 @@ -[[!meta title="Contra o Método"]] - -* Autor: Paul Feyerabend -* Editora: Unesp -* Edição: 1a -* Ano: 2003 - -## Geral - -* Viagens distintas: Odisseus e Sólon: descoberta e pesquisa, 252 (nota de rodapé). -* Lógica e ilógica, 259-262, 265. -* Participante/observador, 292. -* Filosofia pragmática, 293. -* Naturalismo versus idealismo, 299-300. -* Razão versus prática, 301. - -## Conhecimento do conhecimento - -* Cap. 11: importante! Mas também temos que levar em conta que Galileu era Galileu e não um Zé Ninguém, que poderia ser prontamente chamado de lunático. -* Descrição dinâmica de uma "seleção científica" envolvendo múltiplos fatores, por exemplo: - - Em suma: o que é necessário para submeter a teste a concepção de Copérnico é uma - visão de mundo inteiramente nova contendo uma nova visão do homem e de suas capacidades - de conhecer. - - É óbvio que tal nova visão de mundo levará um longo tempo a aparecer e talvez - jamais tenhamos êxito em formulá-la em sua totalidade. É extremamente improvável - que a idéia do movimento da Terra seja de modo imediato seguida pelo aparecimento, - em pleno esplendor formal, de todas as ciências que, diz-se agora, constituírem - o corpo da "física clássica". Ou, para ser um pouco mais realista, tal sequência - de eventos não apenas é extremamente improvável, mas é impossível em princípio, - dada a natureza dos humanos e das complexidades do mundo que habitam. Hoje - Copérnico, amanhã Helmholtz -- isso não passa de um sonho utópico. Contudo, - é somente depois que tenham surgido essas ciências que se pode dizer que um - teste faz sentido. - - Essa necessidade de esperar e de ignorar grande massa de observações e medições - críticas quase nunca é discutida em nossas metodologias. - - -- 164 - -## Regras e princípios - -Regular, irregular, regra: 213. - - Mas nem as regras, nem os princípios nem tempouco os fatos são sacrossantos. - O defeito pode encontrar-se nelees e não na idéia de que a Terra se move. - - -- 177 - -## Miséria do racionalismo - - A invenção de teorias depende de nossos talentos e de outras circunstâncias fortuitas, - como uma vida sexual satisfatória. Contudo, enquanto subsistirem esses talentos, - o esquema apresentado é uma explicação correta do desenvolvimento de um conhecimento - que satisfaz as regras do racionalismo crítico. - - Ora, a essa altura, pode-se levantar duas questões: - - 1. É desejável viver de acordo com as regras de um racionalismo crítico? - 2. É possível ter ambas as coisas, a ciência como a conhecemos e essas regras? - - No que me diz respeito, a primeira questão é bem mais importante que a segunda. - De fato, a ciência e as instituições relacionadas desempenham um papel importante - em nossa cultura e ocupam o centro de interesse pra muitos filósofos (a maioria - dos filósofos é oportunista). Assim, as idéias da escola popperiana foram obtidas - generalizando-se soluções para problemas metodológicos e epistemológicos. O racionalismo - crítico surgiu da tentativa de entender a revolução einsteniana e foi depois - estendido à política e mesmo à vida privada. Tal procedimento talvez satisfaça a - um filósofo de escola, que olha a vida através dos óculos de seus próprios problemas - técnicos e reconhece ódio, amor, felicidade somente conforme ocorrem nesses problemas. - Mas, se considerarmos interesses humanos e, acima de tudo, a questão da liberdade - humana (liberdade da fome, do desespero, da tirania de sistemas de pensamento - emperrados e não a "liberdade da vontade" acadêmica), então estamos procedento - da pior maneira possível. - - Com efeito, não é possível que a ciência tal como atualmente a conhecemos, ou uma - "busca pela verdade", no estilo da filosofia tradicional, venha a criar um monstro? - Não é possível que uma abordagem objetiva, que desaprova ligações pessoais entre - as entidades examinadas, venha a causar danos às pessoas, transformando-as em mecanismos - miseráveis, inamistosos e hipócritas, sem charme nem humor? - - -- 215. - -## Racional e irracional - - Meu diagnóstico e minhas sugestões coincidem com os de Lakatos - até certo ponto. - Lakatos identificou princípios de racionalidade excessivamente rígidos como a fonte - de algumas versões de irracionalismo e insistiu conosco para que adotemos padrões novos - e mais liberais. Identifiquei padrões de racionalidade excessivamente rígidos, bem - como um respeito geral pela "razão", como a fonte de algumas formas de misticismo - e irracionalismo, e também insisto na adoção de padrões mais liberais. Porém, ao passo - que o grande "respeito pela ciência" que tem Lakatos leva-o a buscar esses padrões - nos limites da ciência moderna "dos últimos dois séculos", recomendo colocar a ciência - em seu lugar como uma forma de conhecimento interessante, mas de modo algum exclusiva, - que tem muitas vantagens mas também muitos inconvenientes. - - -- 225 diff --git a/books/filosofia/cristal-fumaca.md b/books/filosofia/cristal-fumaca.md deleted file mode 100644 index 33e6c04..0000000 --- a/books/filosofia/cristal-fumaca.md +++ /dev/null @@ -1,487 +0,0 @@ -[[!meta title="Entre o cristal e a fumaça"]] - -## Geral - -* Gráfico de Bourgeois, pág. 58. -* Delírio, aprendizagem, memória e novidade, 124. -* Metafísica, 146. -* Limites da teoria de Shannon para explicar a hipercomplexidade: ausência de significado, 171. -* Cérebro volumoso, juvenilização, aprendizagem, individuação, 172. -* Erros fecundos, erros fatais em Morin, diversificação, juventude, velhice, 180. - -## Natural ou artificial - - Em particular, será um sistema humano - social, por exemplo - - natural ou artificial? Pelo fato de ser fabricado por seres humanos, ele - parece ser uma organização artificial, como todas as que resultam de - planos e programas saídos de cérebros humanos. Nessa medida, a lógica - dos sistemas naturais bem poderia afigurar-se inadequada, ou até deslo- - cada e perigosa. Entretanto, pelo fato de uma organização social ser - também o resultado da composição de efeitos de um grande número de - indivíduos, trata-se igualmente, sob certos aspectos, de um sistema auto- - organizador natural. Nele, forçosamente, o papel dos planos e programas - é relativamente limitado pelo papel das finalidades e desejos dos indiví- - duos e dos grupos. Mesmo nas sociedades totalitárias, a questão da origem - da autoridade planificadora remete às motivações individuais que fazem - com que a aceitemos ou nos adaptemos a ela. Essas motivações, conscien- - tes e inconscientes, apesar de humanas, não provêm do cérebro de um - engenheiro superdotado. O que equivale a dizer que, numa grande medida, - também elas se oferecem a nossa observação sob a forma de sistemas - naturais imperfeitamente conhecidos, constituídos por suas interações. - - -- 10 - -## Finalismo: teleonomia versus teleologia - - Na verdade, quer o admitamos ou não, há um finalismo implícito na - maioria dos discursos biológicos. Ofa, essa situação é incômoda, do ponto - de vista do método científico, por negar o princípio · de causalidade, - segundo o qual as causas de um fenômeno devem ser descobertas antes, - e não depois de sua ocorrência. Sendo esse princípio um fundamento do - método científico, a impossibilidade de prescindir do finalismo na biolo- - gia era uma deficiência dessa ciência que J. Monod analisou brilhante- - mente na primeira parte de seu livro. - - [...] - - Resumida em termos muito sucintos, sua tese é a seguinte: um processo - teleonômico não funciona em virtude das causas finais, apesar de ter essa - aparência e embora pareça orientado para a realização de formas que só se - evidenciarão no final do processo. O que o determina, de fato, não são essas - formas como causas finais, e sim a realização' de um programa, como numa - máquina programada cujo funcionamento parece orientado para a realização de um - estado futuro, quando, na verdade, é cau.s almente determinado pela seqüência - de estados pela qual o programa preestabelecido a faz passar. O programa em si, - contido no genoma característico da espécie, é o resultado da longa - - -- 18 - -## Origem da vida - - O problema da origem da vida, hoje em dia, é o do aparecimento do primeiro - programa. De fato, a admitirmos a metáfora da programação genética contida nos - ADNs - e veremos, mais adiante, que ela não está a salvo de sérias críticas - , - o programa do desenvolvimento de Um indivíduo lhe é fornecido no nascimento, - por ocasião da fecundação do óvulo, a partir da replicação dos ADNs de seus - pais. Assim, coloca-se a questão da origem do primeiro programa, isto é, do - primeiro ADN capaz de se reproduzir e de codificar a síntese das enzimas. - - Ante essa questão, várias linhas de resposta são possíveis. Uma delas extrapola - a reprodução laboratorial de condições físico-químicas que, supostamente, - teriam sido as da atmosfera primitiva e da •·sopa•• primitiva. Ela se baseia - nos resultados de experiências que demonstraram a possibilidade, nessas - condições, de sínteses de aminoácidos e de nucleo- tídios, tijolos iniciais - indispensáveis à fabricação do já complicadíssimo edifício desse primeiro - programa. Evidentemente, devemos sublinhar o caráter hipotético dessas teorias, - às quais J. Monod, por sua vez, não pareceu dar muita importância. Para ele, a - questão da origem da vida e do primeiro programa era uma questão - não-científica, pois concernia à ocor- rência de um evento de baixíssima - probabilidade, mas que mesmo assim ocorreu, e de uma vez só. Para ele, já que - nada além de encontros moleculares ao acaso poderia explicar a constituição do - primeiro organis- mo vivo, e já que esta, em tais circunstâncias, só poderia - ser imaginada com uma probabilidade praticamente nula, a questão de sua - ocorrência não mais podia ser colocada em termos de probabilidade, a - posteriori, agora que sabemos que isso aconteceu. Tratar-se-ia, portanto, - tipicamente de um evçnto único, não-reprodutível, e que escaparia por definição - ao campo de aplicação da pesquisa científica. - - Outros, ao contrário, como A. Katzir-Katchalsky, 10 M. Eigen 11 e 1. - Prigogine, 12 não desistiram e partiram em busca de leis de organização - - físico-químicas, é claro - que permitissem compreender, desta vez, não apenas - que o primeiro programa não tivera uma probabilidade quase nula, mas que, ao - contrário, sua ocorrência fora obrigatória e inelutável. Dentro dessa - perspectiva, a origem da vida não teria sido um evento único de baixíssima - probabilidade, mas um evento que se reproduziria todas as ve- zes que as - condições físico-químicas da terra primitiva se materializassem. A eventual - descoberta de formas de vida em outros planetas seria, eviden- temente, um - argumento a favor dessa segunda linha de pensamento. - - -- 21 - -## Ordem dos documentos - - É conhecida a história da escrivaninha e das prateleiras entulhadas de - livros e documentos.• Estes, aparentemente, acham-se empilhados de qualquer - maneira. No. entanto, seu dono sabe perfeitamente encontrar, se for preciso, o - documento que procura. Ao contrário, quando, por infelid- dade, alguém ousa pôr - ordem neles .. , é possível que o dono se tome incapaz de encontrar o que quer - que seja. É evidente, neste caso, que a aparente desordem era uma ordem, e - vice-versa. Aqui, trata-se de docu- mentos em sua relação com seu usuário. A - desordem aparente oculta uma ordem determinada pelo conhecimento individual de - cada um dos docu- mentos e de sua possível significação utilitária. Mas, em que - aspecto essa ordem tem a aparência de desordem? É que, para o segundo - observador, aquele que quer ºpôr em ordem .. , os documentos já não têm, - individual- mente, a mesma significação. Em casos extremos, não têm - significação alguma, a não ser a que se liga a sua forma geométrica e ao lugar - que eles podem ocupar na escrivaninha e nas prateleiras, de maneira a que - coinci- dam, em seu conjunto, com uma certa idéia a priori, com um padrão - consiederado globalmente ordenado. Vemos, portanto, que a oposição entre ordem - e aparência de ordem provém de os doc-umentos serem considerados, quer - individualmente, com . sua significação, quer global- mente~ com uma - significação individual diferente (determinada, por exemplo, por seu tamanho ou - sua cor, ou por qualquer outro princípio de alinhamento importado de fora e sem - a opinião de seu usuário), quer ainda sem significação alguma. - - -- 27 - -## Confiabilidade dos organismos - - Daí todo um campo de pesquisas, inaugurado por von Neumann [4] e seguido por - muitos outros, especialmente Winograd e Cowan [3, 6], com a finalidade de - descobrir princípios de construção de autômatos cuja confiabilidade fosse maior - que a de seus componentes! Essas pesquisas resultaram na definição de - condições necessárias (e suficientes) para a realização desses autômatos. A - maioria dessas condi- ções (redundância dos componentes, redundância das - funções, complexi- dade dos componentes, deslocalização das funções) [6, 7] - resultou numa espécie de compromisso entre determinismo e indeterminismo na - cons- trução dos autômatos, como se uma certa quantidade de indeterminação - fosse necessária, a partir de certo grau de complexidade, para pennitir ao - sistema adaptar-se a um certo nível de ruído. Isso, evidentemente, não tleixa - de lembrar um resultado análogo obtido na teoria dos jogos pelo mesmo Neumann [8]. - - [...] - - Quando um sistema se fixa num estado particular, ele fica inadaptável, e esse - estado final pode ser igualmente ruim. Ele será incapaz de se ajustar a alguma - coisa que constitua uma situação inadequada" [9]. - - -- 38 - -## Ordem pelo ruído - - Isso é apenas uma conseqüência de que, na ausência de erros de replicação, - nenhuma novidade pode aparecer. - - -- 49 - - Assim, ao menos em princípio, vemos como uma produção de informação - sob o efeito de fatores aleatórios nada tem de misterioso: ela não passa da - co.nseqüência de produções de erros num sistema repetitivo, constituído - de maneira a não se: destruído quase que de imediato por um número - relativamente pequeno de erros. - - Na verdade, no que concerne à evolução das espécies, nenhum - mecanismo é concebível, à parte os que foram sugeridos por determinadas - teorias, nas quais eventos aleatórios (mutações ao acaso) são responsáveis - por uma evolução orientada para uma complexidade e uma riqueza ma-io- - res da organização. No que concerne ao desenvolvimento e à maturação - dos indivíduos, é muito possível que esses mecanismos também desem- - penhem um papel nada desprezível, especialmente se incluirmos aí os - fenômenos de aprendizagem adaptativa não dirigida, na qual o indivíduo - se adapta a uma situação radicalmente nova, em que é difícil recorrer a - um programa preestabelecido. De qualquer modo, essa noção de programa - preestabelecido, aplicada aos organismos, é muito discutível, na medida - em que se trata de programas de ••origem interna .. , fabricados pelos - próprios organismos e modificados no curso de seu desenvolvimento. Na - medida em que o genoma é fornecido de fora (pelos pais), é freqüente ele - ser assemelhado a um programa de computador, mas essa semelhança nos - parece inteiramente abusiva. Se há uma metáfora cibernética apta a ser - utilizada para descrever o papel do genoma, a da memória nos parece - muito mais adequada que a do programa, pois esta última implica todos - os mecanismos de regulação que não se acham presentes no próprio - genoma. Sem isso, não evitamos o paradoxo do programa que precisa dos - produtos de sua execução para ser lido e executado. Ao contrário, as - teorias da auto-organização permitem compreender a natureza lógica de - sistemas onde o que desempenha a função do programa se modifica sem - parar, de maneira não preestabelecida, sob o efeito de fatores .. aleató- - rios" do ambiente, produtores de .. erros" no sistema. - - Mas, que são esses erros? Segundo o que acabamos de ver, até por - causa de seus efeitos positivos, eles já não parecem ser erros em absoluto. - O ruído provocado no sistema pelos fatores aleatórios do ambiente já não - seria um verdadeiro ruído, a partir do momento em que fosse utilizado - pelo sistema como fator de organização. Isso significaria que os fatores - do ambiente não são aleatórios. Mas eles são. Ou, mais exatamente, - depende da reação posterior do sistema em relação a eles o fato de, a - posteriori, esses · fatores serem reconhecidos como aleatórios ou como - parte de uma organização. A priori, eles são efetivamente aleatórios, se - definirmos o acaso como a intersecção de duas cadeias de causalidade - independentes: as causas de sua ocorrência nada têm a ver com o enca- - deamento dos fenômenos que constituiu a história anterior do sistema até - então. É nesse sentido que sua ocorrência e seu encontro com essa história - constituem ruído, do ponto de vista das trocas de informação no sistema, - e só são passíveis de produzir erros nele. Mas, a partir do momento em - que o sistema é capaz de reagir a esses erros, de modo não apenas a não - desaparecer, mas também a modificar a si mesmo num sentido que lhe - seja benéfico, ou que, no mínimo, preserve sua sobrevivência posterior; - em outras palavras, a partir do momento em que o sistema é capaz de - integrar esses erros em sua própria organização, .eles então perdem um - pouco, a posteriori, seu caráter de erros. Preservam-no apenas de um - ponto de vista externo ao sistema; no sentido de que., como efeitos do - ambiente sobre este, eles mesmos não correspondem a nenhum programa - preestabelecido, contido no ambiente e destinado a organizar ou desorga- - nizar o sistema. 11 Ao contrário, de um ponto de vista interno, na medida - em que a organização consiste precisamente numa seqüência de desorga- - nizações resgatadas, eles só aparecem como erros no instante exato de sua - ocorrência e em relação a uma manutenção, que seria tão nefasta quanto - imaginária, de um statu quo do sistema organizado, que imaginamos tão - logo uma descrição estática dele nos possa ser dada. Caso contrário, e - depois desse instante, eles são integrados e recuperados como fatores de - organização. Os efeitos do ruído tomam-se, então, eventos da história do - sistema e de seu processo de organização. Contudo, permanecem como - efeitos de um ruído, visto que sua ocorrência era imprevisível. - - -- 50-51 - -## Ruído organizacional - - Uma das questões mais difíceis a propósito desse problema capital - das organizações hierárquicas, que encontramos por toda parte na ·biolo- - gia, é a seguinte: como passamos de um nível para outro, ou, mais - precisamente, quais são as determinações causais que dirigem a passagem - de um nível de integração para outro? - - Num sistema dinâmico, descrito por um sistema de equações dife- - renciais, às funções (soluções do sistema) caracterizam o nível em que - estamos interessados; as condições limites caracterizam o nível superior. - Compreendemos perfeitamente como as condições limites, que impõem - as constantes de integração, determinam as funções de soluções do siste- - ma. Mas, inversamente, como podem as funções influenciar as condições - limites? Em outras palavras, como pode um nível inferior - menos - integrado - , na matemática, influenciar o nível superior? Como repre- - sentar o efeito do nível molecular sobre as células, o das células nos órgãos - e o dos órgãos no organismo, embora esse seja o pão de cada dia da - observação biológica? - - -- 60 - - Isso significa que a introdução da posição do observador não cons- - titui apenas uma etapa lógica do raciocínio: esse observador, externo ao - sistema, é, de fato, num sistema hierarquizado, o nível de organização - superior (englobante), comparado aos sistemas-elementos que o consti-_ - tuem; é o órgão em relação à célula, o organismo em relação ao órgão etc. - É em relação a ele que os efeitos do ruído sobre uma via no interior do - sistema, em certas condições, podem ser positivos. - - -- 61 - -## Auto-organização e individuação - - A teoria da auto-organização fornece um princípio geral de diferenciação pela - destruição, eventualmen- te aleatória, de uma redundância que caracteriza o - estado inicial de indiferenciação. Assim, a quantidade de informação contida - num eventual programa genético pode ser consideravelmente reduzida em - comparação com a que seria necessária no caso de uma determinação rigorosa dos - detalhes da diferenciação. Isso parece particularmente pertinente no que - concerne ao desenvolvimento do sistema nervoso, onde uma parcela de - aleatoriedade permite uma considerável economia de informação genéti- ca I 5 - que, de outra maneira, seria insuficiente, caso tivesse que especificar em - todos os seus detalhes um sistema constituído de mais de dez bilhões de - neurônios interligados. Também aí podemos observar, pelo menos em alguns casos, - conexões inicialmente redundantes, que se especificam no curso do - desenvolvimento, perdendo essa redundância. 16 - - [...] - - Esses processos são empregados não apenas nos "reconhecimentos - de formas" que caracterizam nosso sistema cognitivo, mas também na - constituição e no funcionamento do sistema imunológico, verdadeira - máquina de aprendizagem e de integração do novo, desta vez no nível de - formas celulares e moleculares. De fato, o sistema imunológico realiza - uma rede celular em que as células - os linfócitos - são ligadas, entre - si e com os antígenos que constituem seus estímulos externos, por meca- - nismos de reconhecimento molecular ao nível de suas membranas. Tam- - bém aí estamos diante de um sistema de aprendizagem não-dirigida cujo - desenvolvimento é condicionado pela história dos contatos com diferen- - tes andgenos, uma história, evidentemente, pelo menos em parte, não-pro- - gramada e aleatória. Ora, o reconhecimento dos antígenos pelos linfócitos - é o resultado, no nível molecular e celular, de uma seleção de linfócitos - preexistentes, com suas estruturas membranosas adequadas, cuja multi- - plicação é desencadeada pelo contato com determinado antígeno (seleção - clonai). Por isso, a possibilidade de uma variedade praticamente infinita - e imprevisível de reações imunológicas, a partir de um número finito de - linfócitos determinados, implica a cooperação de diversos níveis diferen- - tes de reconhecimento. Uma combinação de células diferentes, pertencen- - tes a níveis diferentes, multiplica consideravelmente a variedade das - respostas possíveis (Jerne 18) . Por fim, também nesse caso, uma redundân- - cia inicial nessa cooperação - transmissão de informações entre diferen- - tes níveis da rede celular que constitui o sistema imunológico - talvez - permita explicar o desenvolvimento com aumento da diversidade e da - especificidade. 19 Este, no final das contas, leva à constituição da indivi- - dualidade molecular de cada organismo, que, no homem, sabemos ser - praticamente absoluta. Na verdade, ela é condicionada pelos encontros - parcialmente aleatórios com estruturas moleculares e celulares trazidas - por um ambiente sempre renovado, pelo menos em parte. - - -- 62-63 - -### Ruído e significação - - Como vimos anteriormente a propósito da história da escrivaninha desar- - rumada, a idéia do sentido e da significação está sempre presente na noção - de ordem, bem como na de informação. Contudo, vimos também que a - teoria de Shannon só permitiu quantificar a informação ao preço da - colocação de sua significação entre parênteses. O princípio da ordem a - partir do ruído, em suas sucessivas formulações quantitativas (H. von - Foerster, 1960; H. Atlan, 1968, 1972, 1975 2 º), utilizou igualmente a teoria - de Shannon, da qual estão ausentes as preocupações com a significação. - Na verdade, o problema do sentido e da significação. continua presente, - muito embora o suponhamos eliminado. Está presente, é claro, nas noções - de codificação e decodificação. Mas também está presente, de maneira - implícita-negativa e como uma espécie de sombra, em todas as utilizações - das noções de quantidade de informação ou de entropia para avaliar o - estado de complexidade, de ordem ou desordem de um sistema. Finalmen- - te, veremos que o princípio de ordem a partir do ruído, apesar de expresso - num formalismo puramente probabilístico do qual o sentido se acha - ausente, repousa implicitamente na existência da significação, e até de - diversas significações da informação. Em outras palavras, trata-se de uma - possível via .de abordagem para a solução do último dos problemas que a - teoria de Shannon negligenciou: o da significação da informação. 2 1 - - Para isso, é conveniente apreendermos, logo de saída, a inversão - que efetuamos em relação à formulação inicial de von Foetster, quando - exprimimos o princípio da ordem através do ruído como um aumento da - variedade, da informação de Shannon e da complexidade, ligado a uma - diminuição da redundância. - - -- 63-64 - -### Complexidade - - Em outras palavras, complexidade é uma desordem aparente onde temos razões para - presumir uma ordem oculta; ou ainda, a complexidade é uma ordem cujo código - não conhecemos. - - -- 67 - - É pelo fato de a informação ser medida (por nós) por uma fórmula - da qual o sentido está ausente, que seu oposto, o ruído, pode ser gerador - de informação. Isso nos permite continuar a exprimi-lo pela mesma - função H, embora sua significação seja diferente, por ser recebida em dois - ·níveis diferentes de organização. A informação, num nível elementar, tem - um sentido que desprezamos quando a medimos pelas fórmulas de Shan- - non, mas que se traduz por seus efeitos em seu destinatário, a saber a - estrutura e as funções desse nível, tal como as percebemos. - - -- 74-75 - -### Delírio - - Qualquer hipótese científica realmente nova é, de fato, da ordem do - delírio, do ponto de vista de seu conteúdo, por se tratar de uma projéção - do imaginário no real. É tão-somente por aceitar, a priori, a possibilidade - de ser transformada ou mesmo abandonada, sob o efeito de confrontações - com novas observações e experiências, qu~ ela fmalmente se separa disso. - Em particular, poqemos compreender como a própria interpretação psica- - nalítica pode desempenhar o papel de um delírio organizado, ou, ao - contrário, o de uma criação libertária, conforme seja vivida de maneira - fechada, como o modelo central - o padrão imutável-, o pólo organi- - zador, ou de maneira aberta, como uma etapa fugaz no processo auto-or- - ganizador. Entretanto, seja qual for o caso, o conteúdo da interpretação - consiste sempre no que costumamos chamar "uma projeção do imaginá- - rio no real". - - [...] - - Dentro dessa pers- pectiva, podemos compreender que esse desvelamento do - delírio no Homo sapiens, latente, por ser inconsciente em seus predecessores, - tenha sido concomitante a'o desenvolvimento da linguagem simbólica, na medi- da - em que este implicou e permitiu, justamente, um considerável aumento das - capacidades de memória, em comparação com as que lhe eram preexistentes. - - -- 124-125 - -### Humanismo - - Num artigo publicado há alguns anos, A. David constatou que cada - um dos progressos da cibernética fazia o homem desaparecer um pouco - mais [6]. Mas um último sobressalto de humanismo o fez localizar em nós - o derradeiro recôndito de onde seria impossível desalojar o homem: seria - o desejo (nosso programa, em outras palavras?). Mediante isso, ele nos - sugeriu uma descrição futurista de homens telegrafados no espaço sob a - forma de "programas puros ... Mas, que acontece com isso quando se - constata que, nos sistemas cibernéticos auto-organizadores dotados da - complexidade dos organismos vivos, o programa não pode ser localizado, - porque se reconstitui sem parar? Pois bem, isso significa que o homem é - finalmente desalojado até mesmo daí, e que para nós é melhor que seja - assim, porque, dessa maneira, a unidade e a autonomia de nossa pessoa, - na medida em que se produzirem, não mais poderão ser telegrafadas no - espaço, separadas do resto, que a superfície que limita um volume e define - sua unidade não pode ser separada desse volume. Alguns programas de - organizações talvez possam ser telegrafados: os sistemas assim realizados - talvez possam assemelhar-se a nós e dialogar conosco. Não há nada de - inquietante nisso, 9 muito pelo contrário, porque eles não serão nós; como - tampouco o são as máquinas, inclusive as mais poderosas, que nos - prolongam. - - [6. A. David, "Nouvelles définitions de l'humanisme", in Wiener e Schadc, - (orgs.), Progress in Biocybernetics, Nova York, Elsevier Publications Co., - 1966.] - - -- 122 - -### Tempo e irreversibilidade - - Mas existe um outro tipo de situação, muito diferente, que aparece - ao observarmos fenômenos naturais - não artificialmente criados por - outro seres humanos -, e quando estes nos parecem orientados de tal - maneira que as coisas acontecem como se fossem determinadas por um - projeto, ou seja, também por uma vontade, um desejo ou uma intenção. - Naturalmente, esse tipo de situação é encontrado, em especial, quando - observamos os sistemas biológicos em todos os seus níveis de organiza- - ção, exceto, talvez, ;io nível molecular. Isso explica que a biologia tenha - freqüentemente dado margem a toda sorte de especulações místicas ou - religiosas, e nem sempre no melhor sentido: se observamos fenômenos - em que as coisas se produzem de maneira aparentemente finalista, como - se resultassem de uma vontade (mesmo que não haja ninguém para nos - dar informações sobre essa vontade), torna-se tentador, é claro, assimilar - a existência dessa suposta vontade à vontade de Deus ou do Criador. O - que vimos até o momento nos mostra em que sentido essa hipótese não é - necessária, pois começamos a compreender como a matéria pode ser um - locus de fenômenos de àuto-organização: em razão de diversos tipos de - interações entre a ordem e o acaso, amostras de matéria podem evoluir de - tal maneira que, aos olhos do observador externo, parecem determinadas - por seu futuro, embora, na verdade, isso não aconteça. - - A verdade é que, nessas situações - e embora não sejamos obriga- - dos a presumir a existência de uma vontade consciente -, estamos - lidando com uma inversão local do tempo, na medida em que se produz - uma diminuição local da entropia. Essa inversão não resulta, é claro, de - uma vontade humana que dite sua orientação, e as vontades humanas são - as únicas que conhecemos, porque a vontade de Deus é apenas uma - abstração da vontade humana. - - -- 143 - - A biologia físico-química nos indica - sem por isso nos dar - nenhuma receita, é claro - como tudo isso é teoricamente possível, pek· - menos em princípio, e como funciona nos sistemas biológicos em desen - - volvimento. Exatamente, embora de maneira abstrata, isso pode se resu- - mir assim: a habitual direção irreversível do tempo se inverte nos proces- - sos em que a entropia de um sistema aberto decresce e em que a - informação e a organização são criadas através da utilização de interações - aleatórias do sistema com seu ambiente. Isso é apenas uma conseqüência - direta do fato de que o habitual caráter irreversível do tempo, na física, é - - determinado pela lei do aumento da entropia. De fato, daí decorre que, - quando se pode produzir uma diminuição da entropia em algum lugar, é - como se a direção do tempo, localmente, fosse invertida nesse ponto; o - que equivale a dizer que a passagem do tempo, de destrutiva, toma-se - criadora. - - -- 149 - -### Novas ciência e epistemologia - - Assim, a ciência do homem, visando a uma ciência do político, desembocaria - inevitavelmente numa ciência do homem conhecedor e sábio, e portanto, numa - ciência sobre a ciência, numa nova epistemologia, e portanto, num novo - paradigma, numa nova prática científica. A reforma da ciência aqui conclamada - implica uma superação da atitude operacional que se impôs e continua a se impor - cada vez mais na prática científica: o objetivo da ciência já não é compreender - - pois, afinal, que é compreender, se só nos colocamos problemas que podemos - resolver e eliminamos todas as questões consideradas "não-científicas"? - , e - sim resolver problemas de laboratório graças aos quais se molda um novo - universo técnico e lógico, que tendemos a considerar -- em virtude de sua - eficácia operacional - coincidente com a realidade física inteira. O fato de - isso não acontecer, de esse universo ser cada vez mais artificial - para ser - repetitivo e reproduzível, para que a antiga ciência possa aplicar-se a ele - eficazmente-, constitui, evidentemente, a razão do abismo que reconhecemos, - sempre com um certo espanto ingênuo, entre as ciências laboratoriais e a - ciência do real vivido . Há nisso uma maquinação da epistemologia ocidental, - que H. Marcuse, ao que saibamos, foi o primeiro a denunciar. Julgou-se que, - para escapar aos engodos da metafísica, a ciência deveria ser apenas - operacional, e eis que nos encerramos no universo alienante e unidimensional do - operacional sem negatividade, onde o estrangeiro e o estranho são simplesmente - rechaçados, afastados, quando não podem ser recuperados. - - -- 181-182 diff --git a/books/filosofia/espionosa-filosofia-pratica.md b/books/filosofia/espionosa-filosofia-pratica.md deleted file mode 100644 index 434c97d..0000000 --- a/books/filosofia/espionosa-filosofia-pratica.md +++ /dev/null @@ -1,8 +0,0 @@ -[[!meta title="Espinosa: Filosofia Prática"]] - - Não é apenas uma questão de música, mas de maneira de viver: é pela velocidade e lentidão - que a gente desliza entre as coisas, que a gente se conjuga com outra coisa: a gente nunca - começa, nunca se recomeça tudo novamente, a gente desliza por entre, se introduz no meio, - abraça-se ou se impõe ritmos. - - -- 128 diff --git a/books/filosofia/estoicismo.md b/books/filosofia/estoicismo.md deleted file mode 100644 index cbdd2ce..0000000 --- a/books/filosofia/estoicismo.md +++ /dev/null @@ -1,79 +0,0 @@ -[[!meta title="Estoicismo"]] - -## Crítica - -* É uma filosofia aceitável para diagnóstico: aceitar os fatos, nossos - limites e a inutilidade das expectativas. - -* No entanto, pode ser conformista: o escravo se acostumar a aceitar - ser escravo, senhor a ser senhor. - -* Também pode ser egocêntrica, uma vez que leva à conclusão que uma pessoa - só pode contar consigo mesma ou, no limite, com seu próprio pensamento. - Na verdade somos completamente dependentes e nada pode ser assumido de - antemão. Mas todos e todas estamos nessa, então alianças são fundamentais! - -* Parece, ao mesmo tempo, uma vida medrosa e mesquinha, porque para evitar - sofrimentos ela prefere se abster de possíveis alegrias. Somos assim tão - frágeis? - -* O estoicismo é útil como parte da bagagem de uma vida simples mas que - luta por melhor condições dentro de um meio social. Ela ajuda a lidar com - as situações difícieis. - -## The Enchiridion - - THE ENCHIRIDION - - - I - - There are things which are within our power, and there are things which - are beyond our power. Within our power are opinion, aim, desire, - aversion, and, in one word, whatever affairs are our own. Beyond our - power are body, property, reputation, office, and, in one word, whatever - are not properly our own affairs. - - Now the things within our power are by nature free, unrestricted, - unhindered; but those beyond our power are weak, dependent, restricted, - alien. Remember, then, that if you attribute freedom to things by nature - dependent and take what belongs to others for your own, you will be - hindered, you will lament, you will be disturbed, you will find fault - both with gods and men. But if you take for your own only that which is - your own and view what belongs to others just as it really is, then no - one will ever compel you, no one will restrict you; you will find fault - with no one, you will accuse no one, you will do nothing against your - will; no one will hurt you, you will not have an enemy, nor will you - suffer any harm. - - Aiming, therefore, at such great things, remember that you must not allow - yourself any inclination, however slight, toward the attainment of the - others; but that you must entirely quit some of them, and for the present - postpone the rest. But if you would have these, and possess power and - wealth likewise, you may miss the latter in seeking the former; and you - will certainly fail of that by which alone happiness and freedom are - procured. - - Seek at once, therefore, to be able to say to every unpleasing semblance, - “You are but a semblance and by no means the real thing.” And then - examine it by those rules which you have; and first and chiefly by this: - whether it concerns the things which are within our own power or those - which are not; and if it concerns anything beyond our power, be prepared - to say that it is nothing to you. - - XII - - If you would improve, lay aside such reasonings as these: “If I neglect - my affairs, I shall not have a maintenance; if I do not punish my - servant, he will be good for nothing.” For it were better to die of - hunger, exempt from grief and fear, than to live in affluence with - perturbation; and it is better that your servant should be bad than you - unhappy. - - Begin therefore with little things. Is a little oil spilled or a little - wine stolen? Say to yourself, “This is the price paid for peace and - tranquillity; and nothing is to be had for nothing.” And when you call - your servant, consider that it is possible he may not come at your call; - or, if he does, that he may not do what you wish. But it is not at all - desirable for him, and very undesirable for you, that it should be in his - power to cause you any disturbance. diff --git a/books/filosofia/metodo.md b/books/filosofia/metodo.md deleted file mode 100644 index cda5750..0000000 --- a/books/filosofia/metodo.md +++ /dev/null @@ -1,24 +0,0 @@ -[[!meta title="O Método"]] - -* Autor: Edgar Morin. -* Editora: Sulina. -* [O Método - Coleção / Edgar Morin](http://editorasulina.com.br/detalhes.php?id=298). - -## Versões digitais - -* [Descarga El Método I Edgar Morin](http://www.edgarmorin.org/descarga-el-metodo-i-edgar-morin.html). -* [Descarga Libro Metodo II al IV](http://www.edgarmorin.org/descarga-libro-metodo-ii-al-iv.html). -* [Volume I em português](https://monoskop.org/File:Morin_Edgar_O_metodo_1_A_natureza_da_natureza.pdf). - -## Tetragrama da Complexidade - -[[!img tetragrama.svg]] - -## Índice - -[[!toc levels=4]] - -* [Volume I](1). -* [Volume II](2). -* [Volume III](3). -* [Volume IV](4). diff --git a/books/filosofia/metodo/1.md b/books/filosofia/metodo/1.md deleted file mode 100644 index 4b00e17..0000000 --- a/books/filosofia/metodo/1.md +++ /dev/null @@ -1,240 +0,0 @@ -[[!meta title="O Método - Volume I"]] - -[[!toc levels=4]] - -## Geral - -* Complexidade: circuito de complementaridade, concorrência e antagonismo de termos irredutíveis. -* Método, originalmente caminhada, 36. -* Jogo, 111. -* Simples, homologia e equivalência, 181. -* Sistema: o conceito complexo mais simples, 187. -* Poíesis, 200. -* Mumford e a máquina faraônica de 100 mil homens-vapor, 211. -* Máquinas artificiais como incompletas: a mais organizacionalmente enferma, 214-215. - -## Ordem e racionalidade clássica - - O universo de fogo, substituindo o antigo universo de gelo, - faz soprar o vento da loucura na racionalidade clássica, - que ligava em si as ideias de simplicidade, funcionalidade - e economia. O calor ainda comporta agitação, dispersão, - ou seja, perda, despesa, dilapidação, hemorragia. - - A despesa era ignorada onde reinava a ordem soberana. Esta - significava, ao contrário, economia. A economia cósmica, - física e política se fundava em uma lei geral do menor esforço, - do menor atalho de um ponto a outro, do menor custo de uma - transformação a outra. A verdade de uma teoria ainda se julga - por seu caráter econômico com relação a seus rivais, mais - dispendiosos em conceitos, postulados, teoremas. - - -- 111-112 - -## Vida - - A vida, acaba-se de ver, é a emanação da organização viva; - não é a organização viva que é a emanação de um princípio vital. - - -- 138 - -## Dependência entre sistemas - - Há neste encadeamento sobreposição, confusão, superposição de - sistemas e há, na necessária dependência de um em relação aos - outros. - - -- 128 - -## Simplexidade: a complexidade necessária da pragmática - -Numa segunda releitura da parte inicial d'O Método, confrontei minha noção de -simplexidade, ou complexidade necessária com o conceito de complexidade -moriniano. - -Há aí, à primeira vista, um óbvio antagonismo de pontos de vista: o simples, -reducionista, seria visto em oposição ao complexo, irredutível. - -O que ocorre, de fato, é que ambas as conceituações são complementares ao -prestarmos atenção à qualidade *necessária* da noção de simplexidade, que -nada mais é do que o estabelecimento de um nível de complexidade de entendimento -e uso do conhecimento para determinado fim. É necessário porque pragmático, -por exemplo para fins didáticos. - -Por quê o simples é sedutor? Pela sua facilidade. A pragmática reducionista -levou a ciência a várias revoluções. Sua sistemática facilitou enormemente -a pesquisa em ciência normal. Mas pode, como Morin aponta n'O Método, -circunscrever o conhecimento apenas naquilo que pode ser restringido a -conceitos simples e irredutíveis, o que cada vez mais se torna impossível: - - O pensamento racionalista comporta um aspecto de racionalização demente - em sua ocultação do gasto absurdo. - - -- 111 - -Não se pode, então, confundir a pragmática de um nível de entendimento da -complexidade necessária da natureza como sendo a natureza de fato. No -uso da simplexidade, "travamos" temporariamente a espiral de conhecimento -para que dele possamos fazer um uso prático usando o que consideramos -conceitualmente mais importante, mais essencial em detrimento do desnecessário -e desimportante. - -Nisto, vale a formulação de Malatesta em seu texto A Organização II: - - Antes de mais nada, há uma objeção, por assim dizer, formal. “Mas de - que partido nos falais? Dizem-nos, nem sequer somos um, não temos um programa”. - Este paradoxo significa que as idéias progridem, evoluem continuamente, - e que eles não podem aceitar um programa fixo, talvez válido hoje, mas - que estará com certeza ultrapassado amanhã. - - Seria perfeitamente justo se se tratasse de estudantes que procuram a verdade, - sem se preocuparem com as aplicações práticas. Um matemático, um quí- - mico, um psicólogo, um sociólogo podem dizer que não há outro programa senão - o de procurar a verdade: eles querem conhecer, mas sem fazer alguma coisa. - Mas a anarquia e o socialismo não são ciências: são proposições, projetos que os - anarquistas e os socialistas querem por em prática e que, conseqüentemente, - precisam ser formulados como programas determinados. A ciência e a arte das - construções progridem a cada dia. Mas um engenheiro, que quer construir ou - mesmo demolir, deve fazer seu plano, reunir seus meios de ação e agir como se - a ciência e a arte tivessem parado no ponto em que as encontrou no início de - seu trabalho. Pode acontecer, felizmente, que ele possa utilizar novas aquisições - feitas durante seu trabalho sem renunciar à parte essencial de seu plano. Pode - acontecer do mesmo modo que as novas descobertas e os novos meios industriais - sejam tais que ele se veja na obrigação de abandonar tudo e recomeçar do - zero. Mas ao recomeçar, precisará fazer novo plano, com base no conhecimento e - na experiência; não poderá conceber e por-se a executar uma construção amorfa, - com materiais não produzidos, a pretexto que amanhã a ciência poderia sugerir - melhores formas e a indústria fornecer materiais de melhor composição. - - Entendemos por partido anarquista o conjunto daqueles que querem contribuir - para realizar a anarquia, e que, por conseqüência, precisam fixar um objetivo a - alcançar e um caminho a percorrer. Deixamos de bom grado às suas elucubrações - transcendentais os amadores da verdade absoluta e de progresso contínuo, que, - jamais colocando suas idéias à prova, acabam por nada fazer ou descobrir. - - https://ayrtonbecalle.files.wordpress.com/2014/03/errico-malatesta-a-organizac3a7c3a3o-ii.pdf - -A simplexidade é justamente o reconhecimento do paradoxo que Malatesta coloca -entre a evolução contínua das ideias e a necessidade do aqui e agora de uma -escolha prática para a organização. - -Assim, minha brincadeira com Morin consiste em negar o reducionismo no próprio -conceito de simplicidade: em contraponto ao simples como irredutível, busco o -simples não-simples, o simples complexo, a complexidade do simples e a -simplicidade do complexo: antagonistas e complementares. - -Saber quando e como se utilizar de determinados níveis de complexidade para a -construção de entendimentos é uma arte. - -A simplificação pode ajudar a andar porém pode cegar da maioria das coisas que -existem e acontecem. Já a complexificação pode dificultar escolhas mas pode -abrir horizontes de compreensão. - -Há também uma ligação fundamental entre simplexidade e bem viver. - - A complexidade não é complicação. O que é complicado pode se reduzir a um princípio - simples como um emaranhado ou um nó cego. Certamente o mundo é muito complicado, mas - se ele fosse apenas complicado, ou seja, emaranhado, multidependente, etc., bastaria - operar as reduçõe sbem conhecidas [...] O verdadeiro problema, portanto, não - é devolver a complicação dos desenvolvimentos a regras de base simples. A complexidade - está na base. - - [...] - - O simples é apenas um momento arbitrátrio de abstração arrancado das complexidades, - um instrumento eficaz de manipulação laminando um complexo. - - -- 456 - -## Finalidade e causalidade - - O erro é não apenas reduzir o universo da vida, do homem, da sociedade ao das - máquinas artificiais, é também redurzir o unoiverso das máquinas artificiais às - máquinas artificiais. O erro está na recionalização cibernética que só quer ou - só pode ver no ser vivo e no ser social uma máqiuna lubrificada e funcional que - pde para ser mais lubrificada e mais funcionalizada para sempre. Tal - racionalização finalitária se torna simétrica à antiga causalidade elementar, - pois, como esta, ela expulsa a incerteza e a complexidade. O erro é o mesmo do - pensamento tecnocrático que fez da máquina o eídolon de toda vida, o novo - ídolo, a rainha do mundo robotizado! A finalidade é certamente uma emergência - cibernética da vida, mas ela emerge na complexidade. Que seja no nível do - organismo, do indivíduo da reprodução da espécie, do ecossistema, da sociedade, - a ideia de finalidade deve ser simultaneamente integrada e relativizada, ou - seja, complexificada. É uma noção que não é nem clara, ne distinta, mas - pestanejante. A complexidade a desmultiplica, mas também a escurece. Os - objetivos práticos, as operações funcionais, são claros e evidentes, mas eles - se engrenam nas finalidades cada ve menos claras e menos evidentes... - - -- 325 - - A dialógica, as dialéticas endo-exocausais têm um caráter aleatório. Quer dizer - que a causalidade complexa comporta um princípio de incerteza: nem o passado nem - o futuro podem ser inferidos diretamente do presente (Maruyama, 1974). Não pode - mais haver nem explicação segura do passado nem futurologia arrogante: pode-se, - deve-se construir cenários possíveis e improváveis para o passado e para o futuro. - - É preciso compreender que mesmo a causalidade pode ter um efeito ínfimo, ou, - pelo contrário, devido às retroações amplificadoras, desestruturadoras, - morfogenéticas que ela desencadeará, ser como uma avalanche durante séculos e - séculos. - - -- 329 - -## Informacionalização - - Como a informação é cada vez mais captada pelo inimigo, que se tornando cada - vez mais inteligente, como o inimigo extrai de nossos traços marcas, odores, - etc., informações para nos situar, então se desenvolvem conjuntamente a - camuflagem, o engodo, a esperteza e a arte de detectar a camuflagem, o engodo e - a esperteza. A informação se torna agora equívoca e ambivalente: ela adverte e - trai; ela informa eventualmente aquele que não deve informar: o inimigo, o - concorrente. Grande "progresso" na história da vida: a entrada da enganação na - comunicação. De agora em diante, a vitória não pertence mais somente à força e - ao endereço, mas também à esperteza, depois à mentira (homo sapiens). A mentira - humana, ao se sociologizar, ao se ideologizar, desdobra-se, frutifica, triunfa, - já que ela está ornada das virtudes da verdade. Quanto mais o universo for - informacionalizado, mais ele será assim, até que a saturação de mentira e de - hipocrisia desencadeie uma inversão da tendência, como eu quero esperar. - - -- 404 - - Todo o poder de Estado dispõe do poder programador/ordenador sobre a sociedade - (poder de regular, legislar, deretar), do poder estratégico (elaborar e decidir - as políticas a seguir) e do poder de comando/controle. O Estado dito - "totalitário" vai mais longe: ele concentra em si a memória oficial (o poder de - escrever a História do passado e de ditar a história do presente), o controle - de todos os meios de expressão e de comunicação da informação: o monopólio do - saber verídico pelo menos no que diz respeito à sociologia e à política, - eventualmente em matéria de ciência e de artes; o controle direto de todos os - aparelhos econômicos e outros. - - [...] - - A idéia-chave que o poder está na produção deve ser lida e compreendida não no - sentido restrito, economista do termo produção, mas no seu sentido - organizacionista/informacional. Não é o poder sobre os "meios" de produção, é - o poder sobre a produção da produção, ou seja, a generatividade social: não é - apenas a propriedade das coisas, dos bens: o domínio está no domínio dos meios - de domínio; a dominação dos meios de dominação; o controle dos meios de - controle: o poder informacional do aparelho. - - Vê-se aqui a justeza e o erro de Marx. Marx buscava o que era gerador na - sociedade, e é com uma retidão admirável que ele priorizou, antropologicamente, - a noção de ser genérico, e, sociologicamente, a noção de produção. Mas o único - fundamento que oferecia a física da época era de natureza energética: o - trabalho; da mesma forma, ele vira na sociedade o poder de classe, não o poder - do aparelho. - - Ora, a teoria do Aparelho genofenomenal da uma Sociedade concebida como - organização informacional/comunicacional pode apenas renovar e enriquecer o - problema sociológico da dominação e do poder. Ela nos leva a detectar o - problema-chave da monopolização da informação. O pode é monopolizado assim que - um aparelho liga diretamente o poder ao saber (quem reina detém a verdade), o - bastão de comando ao cetro, o sagrado ao político, e por isso uma casta ou uma - classe de aparelho monopoliza as formas múltiplas de informação. A exploração e - a dominação coincidem com a relegação dos explorados e dominados às tarefas - puramente energéticas de execução, com a sua exclusão da esfera - generativa/programadora. Eles só têm direito aos sinais informando-os do que - eles devem fazer, pensar, esperar, sonhar. - - -- 418 - 419 diff --git a/books/filosofia/metodo/2.md b/books/filosofia/metodo/2.md deleted file mode 100644 index ba26fae..0000000 --- a/books/filosofia/metodo/2.md +++ /dev/null @@ -1,744 +0,0 @@ -[[!meta title="O Método - Volume II"]] - -[[!toc levels=4]] - -## Geral - -* Ecologia da ação, complexidade das ações e incerteza das consequências, 100. - -## Simplicidade e complexidade - - É a procura de uma simplicidade elementar que nos conduz a uma complexidade - fundamental. - - -- 128 - -## Vida: necessidade do genona - - A generalidade produz e mantém processos organizadores que são, fisicamente, - improváveis. A generatividade física (seres organizadores de si) é sempre - espontânea, isto é, não dispõe de aparelho informacional para controlá-la - ou programá-la. Os seres vivos se desintegrariam se dependessem apenas das - regulações físicas, químicas, termodinâmicas espontâneas. A generatividade - biológica (seres auto-organizadores) comporta, necessariamente, agenciamento - genético e informação hereditária. - - -- 136 - - Assim como a fetichização do capital econômico impede que as outras dimensões - da vida social tomem forma, a fetichização do capital genético impede que as - múltiplas dimensões da auto-organização tomem forma. - - Assim, sob o duplo efeito da redução química e da coisificação informática, o - gene é isolado, hipostasiado. Apesar e por causa dos progressos da genética e - da biologia molecular o paradigma de simplificação pesa no sentido de um - subdiscurso vulgarizador, de caráter atomizador (que situa o fundamento - organizacional do ser vivo na unidade de base, isto é, na molécula, na - informação, no gene), mecanística (que reduz a lógica da organização viva à - máquina artificial), coisificador (que substancializa a informação/programa). O - subdiscurso, larvar na genética torna-se o discurso "genetista" propriamente - dito e, desenvolvendo-se sem entraves, transforma-se em mito pangenetista. - Assim, a incapacidade para conceber a unidade complexa do genos e do fenon na - auto-organização transforma o gene em gênio e o DNS em Adonai. - - -- 155 - -## Misc - - O ego-autocentrismo parece invulnerável. O indivíduo não pode agir senão para - si e para os seus. Como tudo aquilo que é invulnerável, o ego-autocentrismo tem - seu ponto vulnerável, não no calcanhar, mas na cabeça, ou melhor dizendo, na - computação. O ponto forte de todo o ser computante, que é extrair informação - do seu universo, é também o seu ponto fraco: a possibilidade de erro. A - computação pode enganar-se nos seus cálculos, ou tratar uma informação - enganadora. Assim, todo o indivíduo pode tornar-se o instrumento da sua própria - perda enquanto julga trabalhar para a sua salvação. - - O ser computante pode até ser despossuído do seu próprio ego-autocentrismo, - como no caso da célula parasitada por um vírus, o qual, fazendo-a executar o - seu programa de reprodução, a faz agir para a sua própria destruição e para a - multiplicação do seu assassino. Os humanos tornaram-se mestres na sujeição dos - animais que, embora conservem a autonomia cerebral, isto é, o - ego-autocentrismo, estão de fato subjugados às finalidades dos subjugadores e - sobretudo tornaram-se mestres na sujeição do homem pelo homem, como já - indicamos. - - -- 197, 198 - -## A discriminação cognitiva de "si" - - "Se algum organismo não se conhece a si próprio, como pode detectar a - presença de alguma coisa estranha?" (Vaz e Varela, 1978) - - -- 181 - -Ou, analogamente, se um organismo parasse de se reconhecer, seu sistema imunológico -poderia atacar a si mesmo. - -## Computo ergo sum - -* Computação, "com-puter": examinar, avaliar, estimar supor ("puter") em cojunto, ligando ou confrontando aquilo que está separado, separando ou dissociando aquilo que está ligado ("com") (183). -* Autos: idem e ipse (196). -* Princípio de exclusão: identificação do si e do não-si. -* Vida: auto-computante: computa a si mesma. -* Si: referência corporal objetiva (213), corporalidade (214). -* Eu: auto-referência subjetiva do ser vivo (190), afirmação egocêntrica (213). -* Mim: auto-referência objetiva do ser vivo (190), referência objetiva do eu e referência subjetiva do si (213). - -Trechos: - - O cogito começa a aparece como um anel espiral. - - -- 202 - - Ora, evidentemente, as demonstrações "idealistas" que desprendem o sujeito da - órbita física e do mundo das coisas não são de modo algum comprobatórias. Em - geral, o cogito é insuficiente como prova científica ou lógica para dizer - alguma coisa sobre a natureza material ou imaterial do mim, sobre a sua - realidade transcendental ou fenomênica. Toda a busca de prova, deste domínio, - necessita da comunicação do cogitante com o universo exterior e da - intercomunicação dos cogitantes entre eles. Ora, o cogito funda-se - exclusivamente na autocomunicação do sujeito consigo mesmo e a sua validade - concerne, exclusivamente, a qualidade de sujeito. E é precisamente esse caráter - de autocomunicação que, embora constitua o seu limite, constitui a riqueza do - cogito, pensamento recorrente em ação, gerando e regenerando o seu próprio - começo, a sua própria origem, produzindo nesse mesmo processo sua unidade - complexa e as suas qualidades emergentes, que são aqui as qualidades próprias - do sujeito consciente. - - --- 204, 205 - - O computo não "pensa" de modo ideal, isto é, isolável. "Pensa" (computa) de - modo organizacional. O computo concerne o "eu sou", não no plano da consciência - ou da representação, mas no plano da produção/geração/organização. Não existe - certamente constituição de sujeito consciente ao nível da "Escherichia coli". - Mas, talvez, constituição do sujeito puro e simples no e pelo "computo". - - -- 207 - - Como Piaget indicou, freqüentemente a organização do conhecimento humano - constitui um desenvolvimento original da organização biológica e, por - conseguinte, "existem funções gerais comuns aos mecanismos orgânicos e - cognitivos" (Piaget, 1967, p. 206). Neste sentido, "o funcionamento cerebral - exprime ou prolonga formas muito gerais e não particulares de organização - (biológica)" (Piaget, 1967, p. 545). Podemos pois dizer que, "numa certa - profundidade, a organização vital e a organização mental constituem apenas uma - única e mesma coissa" (Piaget, 1968, p. 467). Podemos portanto ir ainda mais - longe e considerar que todo o ato de organização viva comporta uma dimensão - cognitiva. - - [...] - - Assinalar um fenômeno de conhecimento no ser celular aparece decerto como uma - verdadeira projeção retrospectiva do indiferenciado. Mas esta projeção pode - justificar sua necessidade: seria absurdo negar a atividade cognitiva num ser - que apresenta suas condições (aparelho computante) e os seus resultados - (distinção do si/não-si, extração de informações do universo exterior, etc.). A - idéia de que a auto-organização viva comporta uma dimensão cognitiva dá sentido - e coerência ao conjunto dos dados relativos à organização celular. Mas, ao - mesmo tempo, traz um aparente não-sentido à idéia de conhecimento, uma vez que - trata de um conhecimento que não se conhece a si mesmo. Schelling dizia: "A - vida é um saber que ignora a si mesmo...". - - -- 207, 208 - - A partir daí, o paradoxo do conhecimento que não se conhece agrava-se: como - pode haver autoconhecimento para um conhecimento que não se conhece? - - [...] - - Estaríamos inteiramente desarmados diante do problema do autoconhecimento se - não tivéssemos já reconhecido a auto-referência no âmago de todos os processos - celulares e de informação (portanto de autoinformação), de comunicação - (portanto de autocomunicação), de computação (portanto de autocomputação). - Significa, ao mesmo tempo, que o circuito auto-referente de si a si faz - regressar o computado ao computador; sendo o computado também o computador, o - computado-computador regressa à computação do computador. Trata-se de um - circuito autocognitivo no qual o computador está apto não só para computar-se - na parte por intermédio do todo, no todo por intermédio das partes, mas também - para objetivar-se como computado (si, mim) e ressubjetivar-se como computador - (eu). - - -- 209 - - Devemos também supor que esses termos [...] são como que instâncias - referenciais que fazem circular a reflexão de um ponto de vista a outro, cada - uma das quais permite ao sujeito reconhecer ou afirmar um dos seus rostos. - - -- 213 - - Já vimos aquilo que separa uma computação cerebral que só gera representações e - uma computação celular que gera a vida. O computo celular produz o ser objetivo - e, ao mesmo tempo, a modalidade subjetiva do ser. É o operador do circuito no - qual, simultaneamente, o ser e a modalidade subjetiva do ser se geram e se - regeneram, permanentemente. - - -- 214 - - Temos que entender radical, fundamental, plenamente: computo ergo sum. Computo - não significa "tenho um computador na minha máquina". Não significa apenas "sou - um ser computante". Significa "eu computo, logo eu sou". - - -- 216 - -## Existencialismo - -Turnover molecular, turbilhão computante (221, dentre outras). -Jogo, erro e morte (217), a tragédia básica da existência e a solidão comunicante (218): - - Assim, a autou-afirmação individual do indivíduo-sujeito é a de um ator que - joga o jogo de viver para ganhar a vida. A noção de ator é existencial no - sentido em que o ator se joga a si mesmo -- joga a sua vida -- na busca, no - esforço, no perigo no seio do "teatro" natural que é o seu ambiente. A condição - existencial do jogo marca toda a vida: é a natureza sempre renascente e a luta - sempre renascente contra a incerteza. - - O ator vivo mais modesto dispõe, para jogar o seu jogo, do seu capital de - informações hereditárias e do computo egocêntrico que lhe permite transformar a - informação em programa, extrair informações do mundo exterior, agir em função - da situação. mas o computo comporta a sua brecha de incerteza: o risco de erro. - Toda a existência viva traz consigo o risco permanente de error (no - funcionamento auto-organizador, na percepção do mundo exterior, na escolha ou - na decisão, na estratégia do comportamento) e todo o risco de erro traz consigo - o risco e morte. - - [...] - - Como vimos, a morte não é o inimigo mortal da vida (porque, sem deixar de ser - desintegrante, está integrada nas transformações e regenerações da vida). Mas é - inimiga mortal do indivíduo-sujeito. - - -- 217 - - Toda a existência que joga é, simultaneamente, jogada e joguete. [...] O - estatuto do objetivo é incerto, improvável, aleatório, perecível, mas este - indivíduo, por improvável e pouco necessária que seja a sua vinda ao mundo, por - inexoravelmente mortal que ele seja, torna-se, logo que nasce e se forma, um - ser absolutamente necessário "para si" e tende a viver a todo custo, - indefinidamente. Aí reside a tragédia da existência viva. O indivíduo é um - quantum de existência, efêmero, descontínuo, pontual, um "ser-lançado-no-mundo" - entre ex nihilo (nascimento) e in nihilo (morte) e é ao mesmo tempo um sujeito - que se autotranscende acima do mundo. Para ele, é o centro do universo. Para o - universo, não passa de um vestígio corpuscular, um estremecimento de onda. Para - ele é sujeito, para o universo é objeto. É a sua própria necessidade, embora - tenha nascido por acaso, viva no acaso e morra no acaso. Nasceu no meio de - milhões de sementes inutilizadas, dilapidadas, volatilizadas, formou-se num - mistério de agregação, de epigenetização, de animação, que, do nada, produziu - este instante periférico que se julga o umbigo do mundo. - - [...] - - O ser vivo, por constituição, está destinado à solidão existencial. Produz e - mantém a sua membrana-fronteira. Opera a cisão ontológica entre si e não-si. A - sua computação está numa câmara escura, e as informações que extrai são - traduções. - - [...] - - A solidão, a separação, a incerteza constituem as condições prévias e - necessárias da comunicação. Só os solitários podem e devem comunicar. - - -- 218 - - O computo tem o papel vital e fundamental de traduzir acontecimentos em - informações a computar por e para si. A partir daí, surge um problema que se - tornará permanente e agudo na existência animal: como evitar o erro, como - induzir em erro o adversário, o inimigo? - - [...] - - Como veremos cada vez mais claramente, a afetividade é a consequência, não a - origem, da existência subjetiva. - - [...] - - A relação entre recepção de estímulos exteriores (a bactéria dispõe de - químico-receptores) e o computo abre a porta à sensibilidade. A partir daí, - tudo aquilo que acontece de nefasto ou benéfico é não só computado como "bom" - ou "mau" (para si), mas também pode ser sentido como irritante ou apaziguante. - As sensibilidades e irritabilidades progridem com o desenvolvimento dos - receptores sensoriais e das redes nervosas. - - -- 219 - -## O Sujeito - -Sujeito (220): - -* Esqueleto lógico-organizacional e carne ontológico-existencial. -* Lógico: auto-referência, distribuidor de valores. -* Organizacional: conceito inerente e necessário à auto-(geno-feno-eco)-organização. -* Ontológico: sua afirmação individual egocêntrica é inerente e necessária à definição do ser vivo. -* Existencial: cada um dos seus traços constitutivos comporta uma dimensão existencial. - -Trechos: - - O sujeito, repito, não é uma substância, uma essência, uma forma. - É uma qualidade de ser [...] - - --- 221 - - Assim, podemos ver que a qualidade de sujeito não é um epifenômeno ou uma - superestrutura da individualidade viva, mas uma infra-estrutura que permite - inscrever muito profundamente o indivíduo e o genos um no outro. Com efeito, - não é apenas a mensagem genética que é necessária à constituição do sujeito. - É a estrutura reprodutora que é indispensável à estrutura do sujeito, ao menos - na esfera originárias e fundamental do unicelular. Reciprocamente, não é - apenas a existência de um indivíduo que é necessária à reprodução genética. - É a estrutura primeira do sujeito que é indispensável à estrutura reprodutora - primeira. - - --- 223 - - Marx dizia que a chave da autonomia do macado reside na autonomia do homem. - Entendia com isso que o desenvolvimento, no homem, de qualidades potenciais - ou embrionárias no macaco, permitia perceber aquilo que seria invisível - se tivéssemos considerado o macaco isoladamente da evolução pela qual o - metamorfoseou em homem. Em outras palavras, o ulterior permite conceber o - anterior. Temos, pois, de prolongar a fórmula marxiana relativa ao macaco pela - proposição contrária mas complementar, e pela conjugação em anel destas duas - proposições [...] Em outras palavras, a chave de ambos está no movimento - e confrontação initerrupto produtor de hipóteses e de teorias. - - -- 224 - -## Comunicação, redes e o outro (alteridade) - -* Egoísmo e altruísmo, 232. - -Trechos: - - A faculdade de computar o outro como alter ego/ego alter é sem dúvida - inseparável da faculdade de se computar a si "objetivamente" como um outro - si-mesmo (alter ego) e de identificar este alter ego com a sua própria - identidade subjetiva. [...] A comunicação entre congêneres exterioriza, - num outro semelhante a si, os processos internos de objetivação/subjetivação, - proteção/identificação. Constitui-se, entre os dois parceiros, de modo - recíproco, um circuito de proteção (de si sobre o outro) e de identificação - (do outro consigo). - - -- 228 - - Assim, o anel que encerra o sujeito sobre si mesmo abre-lhe ao mesmo tempo a - possibilidade de comunicar-se com outrem. - - -- 229 - -## Estratégia e inteligência - - Veremos cada vez melhor que as noções de arte, estratégia, inteligência, - bricolagem (estratégia organizadora de um novo objeto por conversão de antigos - objetos ou elementos da sua finalidade ou função) são intercomunicantes. - - [...] - - Quando programa tende a comandar, diminuir, suprimir as estratégias, a - obediência mecânica e míope torna-se modelo de comportamento. À escala humana, - a estratégia necessita de lucidez na elaboração e na conduta, jogo de - iniciativas e de responsabilidades, pleno emprego das competências individuais, - isto é, pleno emprego das qualidades do sujeito. Eis por que, entre - parênteses, o Método aqui procurado nunca será um programa, isto é, uma receita - preestabelecida, mas um convite e uma incitação à estratégia do pensamento. - - -- 257 - -## Liberdade - -* Definição, 258. -* Suicídio, 259. - -## Sociedades: entidades de terceiro tipo - - Não existe fronteira bem nítida entre as associações mais ou menos frouxas e as - sociedades rudimentares. Mas o que importa aqui é definir um fenômeno não na - sua fronteira incerta, mas na sua emergência própria. O fenômeno social emerge - quando as interações entre os indivíduos do segundo tipo produzem um todo - não-redutível aos indivíduos e que retroage sobre ele, isto é, quando se - constitui um sistema. Existe, portanto, sociedade quando as interações - comunicadoras/associativas constituem um todo organizado/organizador, que é - precisamente a sociedade, a qual, como toda a entidade de natureza sistêmica, é - dotada de qualidades emergentes e, com as suas qualidades, retroage enquanto - todo sobre os indivíduos, transformando-os em membros desta sociedade. - - -- 264 - - O sistema social não é apenas um sistema: é uma organização que organiza - retroativamente a produção e a reprodução das interações que a produzem, - assegura a sua homeostasia através do turnover dos indivíduos que morrem e - nascem e, assim, continua a ser um ser-máquina autoprodutor e auto-organizador. - - -- 265 - -## Totalitarismo - - Um novo e enorme poder de Estado tende a concentrar-se ao longo do século XX. - - O Estado torna-se cada vez mais Estado-providência e Estado assistencial - (Welfare state). Num sentido, dedica-se cada vez mais à proteção e ao - bem-estar dos indivíduos, mas, ao mesmo tempo, estende as suas competências a - todos os domínios das vidas individuais, doravante encerradas numa rede - polimórfica, simultaneamente casulo (protetor mas eventualmente infantilizante) - e armadilha. Assim, desenvolve-se um Estado, de certo não totalitário, mas - totalizante, isto é, englobando todas as dimensões da existência humana. - - Os notáveis desenvolvimentos informáticos, de que hoje se discutem as - ambivalências (Nora, Minc, 1978), deixam entrever espantosas possibilidades de - desconcentração comunicacionais e de que beneficiariam os indivíduos. Mas, ao - mesmo tempo, a informática dá a um aparelho de Estado central a possibilidade - de agrupar e tratar todas as informações acerca de um indivíduo de modo muito - mais ramificado e preciso que o controle neurocerebral sobre as células dos - nossos organismos. A partir daí, um código policial/tecnológico (munido de - dispositivos de detecção e de escuta em todos os terrenos) pode doravante - exercer-se sobre o desvio, anomalia, originalidade. A isto é necessário - acrescentar já as futuras ações bioquímicas sobre o espírito ----- cérebro - - humano, que permitirão estabelecer uma normalização generalizada de todo o - desvio. Doravante, o Estado encontra-se dotado de poderes que, virtualmente, - excedem todos os poderes de controle e de intervenção jamais concentrados. - - Aqui mesmo, temos de inscrever o processo aparentemente marginal, - sociologicamente menor, que já constatei (Método I): o conhecimento científico - produz-se cada vez menos para ser pensado e meditado por espíritos humanos, mas - cada vez mais acumulado para a computação dos seus computadores, isto é, para a - utilização das entidades superindividuais, em primeiro lugar a entidade - supercompetente e onipresente: o Estado. Ao mesmo tempo e correlativamente, - essa ciência cega-nos: o resto do nosso mundo, da nossa sociedade, do nosso - destino é despedaçado por um conhecimento científico que, atualmente, ainda é - incapaz de pensar o indivíduo, incapaz de conceber a noção de sujeito, incapaz - de pensar a natureza da sociedade, incapaz de elaborar um pensamento que não - seja unicamente matematizado, formalizado, simplificador, mas, ao contrário, - muito capaz de fornecer aos poderes novas técnicas de controle, de manipulação, - de opressão, de terror, de destruição. - - Ao aproximarmo-nos, pois, do momento em que podemos considerar que todos estes - processos conjuntos poderiam permitir ao ser do terceiro tipo realizar-se em - onipotência, não só sujeitando-nos e manipulando-nos, mas também - infantilizando-nos, irresponsabilizando-nos e despossuindo-nos da aspiração ao - conhecimento e do direito ao juízo. - - Tal hipótese não é brincadeira intelectual, pois o Estado dedicado a essa - realização surgiu no século XX: o Estado totalitário. Instala-se, sob diversas - variantes, em todos os continentes, em todas as civilizações, em todas as - sociedades, sob o impulso, o controle, a apropriação de um aparelho soberano: o - partido detentor de todas as competências, possuidor de verdade sobre o homem, - a história, a natureza. - - A partir daí, bastaria que este Estado totalitário concentrasse e utilizasse de - modo sistemático todas as formas de dominação/controle, não só burocráticas, - policiais, militares, mitológicas, políticas, mas também científicas, técnicas, - informáticas, bioquímicas, para que se pudesse operar uma sujeição das classes, - grupos, indivíduos, já não apenas generalizada mas irreversível; regressões dos - direitos individuais já não são apenas generalizadas mas irreversíveis. - Podemos, certamente, esperar que nossos totalitarismos contemporâneos sejam os - monstros provisórios nascidos das agonias e gestações deste século. Mas podemos - recear também que estes monstros se tornem duradouros na e pela - sujeição/controle estrutural dos indivíduos do segundo tipo e, por isso, - constituam os artesãos de um desenvolvimento decisivo do ser do terceiro tipo. - - -- 281, 282 - -## Autos - - Autos significa "o mesmo": não identidade consigo mesmo fundada numa - invariância estáica, não identidade de dois termos distintos e semelhantes, mas - unidade de um anel que, girando incessantemente do mesmo ao si mesmo, produz e - reproduz o mesmo. - - O autos pertence à raça dos anéis turbilhonares. Um ciclo genérico de - reproduções faz suceder os vivos aos vivos. Um turnover fenomênico faz suceder - as moléculas às moléculas, as células às células (se policelular), os - indivíduos aos indivíduos (sociedade). Assim como um turbilhão desenha uma - figura estável no seio do fluxo, igualmente, e ainda mais, o dinamismo - turbilhonar do autos produz, a partir de uma inscrição genética invariante, - formas corporais aparentemente estáticas (células, organismos, sociedades) e - aparece desenhar no tempo um esquema ou pattern fixo. Aqui reencontramos o - vínculo pseudo-antinômico entre o movimento irreversível e o estado - estacionário, dinamismo e a estabilidade, já bem elucidado (O Método !). - - -- 287 - - O princípio de integração próprio de autos é, portanto, um princípio - polianelante complexo que permite construir, simultaneamente, vários graus de - auto-organização, de individualidade, de ser, de existência. Uma propriedade - notável destas integrações mútuas é que as relações de pertença não anulam as - relações de exclusão: cada ser permanece, no seu grau, um indivíduo-sujeito - egocêntrico, embora "pertença" a um mega-ser, ele mesmo egocêntrico, de que é - uma parte ínfima e enferma. - - De onde as consequências perturbadoras para a ontologia tradicional: embora os - seres-sujeitos se excluam uns aos outros do seu lugar egocêntrico, podem, - contudo, constituir vários seres em um, um ser em vários e, ao mesmo tempo, - fragmentos de mega-seres. - - -- 290 - -## Hierarquia e especialização - -* Problemas e vulnerabilidades da estrutura em rede centralista/hierárquica/especializada: 359. - -Trechos: - - A hierarquia constitui uma estrutura de sujeição, na qual os seres celulares - estão sujeitos aos indivíduos policelulares, sujeitos Pas sociedades de que - fazem parte. Os seres sujeitados continuam sujeitos, mas na ignorância (e, no - caso dos humanos, na inconsciência), trabalham para os fins dos sujeitos que os - sujeitam. - - Mesmo quando há arquitetura de emergências, a organização hierárquica comporta - uma certa alienação do sujeito (que trabalha para os outros trabalhando para si) - e uma virtualidade de subjugação e de exploração (remeto para as definições - dadas na primeira parte). É, efetivamente, a partir do controle e da dominação: - do baixo pelo alto, da parte pelo todo, do micro pelo macro, dos executantes - pelos componentes, dos informados pelos informantes, que se estabelecem as - relações de exploração infra-organizacional. E de fato, as "altas" formas - globais (do organismo, da sociedade) mantêm-se e perduram no e pelo turnover - das "baixas" formas, ou seja, vivem de mortes/renascimentos initerruptos dos - indivíduos celulares, verdadeiro fluxo regenerador que mantém a permanência, - a estabilidade, a sobrevivência do indivíduo sujeitante. - - -- 350-351 - - A organização recorrente relativiza a noção de hierarquia, uma vez que a - hierarquia depende, na sua própria existência, daquilo que depende dela. - Temos de ir mais longe e reconhecer que, em toda a organização viva, a - organização hierárquica precisa de organização não-hierárquica. - - [...] - - A anarquia não é a não-organização, é a organização que se efetua a partir - das associações-interações sinérgicas entre seres computantes, sem que, - para tal, haja necessidade de comando ou controle emanando dum nível - superior. É assim que se constituem as eco-organizações. Ora esta anarquia - sem controle superior constitui um todo que estabelece seu controle superior. - - -- 352 - - Enfim, o parasitismo desenvolve-se no seio das organizações - cêntricas/hierárquicas/especializadas do nosso universo antropossocial. Com - efeito, o indivíduo ou a casta que detêm o poder de Estado podem saciar sem - freios (não sendo controlados pela regra que controlam) os seus apetites - egocêntricos e parasitar o conjunto do corpo social, assumindo mais ou menos - corretamente as suas funções de interesse geral. - - -- 359 - - Toda a concepção ideal de uma organização que seria apenas ordem, - funcionalidade, harmonia, coerência é um sonho demente de ideólogo ou/e de - tecnocrata. A irracionalidade que elminaria a desordem, a incerteza, o erro não - é senão a irracionalidade que eliminaria a vida. - - -- 365 - - Parece que toda a passagem de um micronível de organização a um macroniível, - como do unicelular ao ser policelular, da sociedade arcaica de algumas centenas - de membros à sociedade histórica de milhões de indivíduos, a complexidade da - nova macroorganização é menor do que a da microorganização que intefra ou - desintegra. Assim, os primeiros organismos policelulares, de estrutura - demasiado frouxa ou demasiado rígida, não puderam elevar-se até o nível de - complexidade organizacional da célula, e foram necessários unúmeros - desenvolvimentos evolutivos (desenvolvimentos de órgãos e aparelhos internos, - entre os quais o aparelho neurocerebral, o aparelho sexual, etc.) para que - organismos superiores atinjam novos níveis de complexidade. - - [...] - - Talvez -- talvez? -- toda mudança de escala, todo salto em direção a um - metassistema mais amplo deva apagar-se, num primeiro estádio, com uma pobreza - organizacional, misto de ordem rígida e de desordem destruidora, antes de - aparecerem as estruturas e emergências novas? E, neste sendido, estamos na era - de gênese uraniana de uma organização social que ainda não encontrou a - hipercomplexidade que torna possível a evolução cerebral pelo Homo sapiens (cf. - Morin, 1973, p. 206-209). - - Com efeito, parece possível conceber um progresso organizacional baseado na - regressão das especializações, das hierarquias, da centralização -- de onde a - regressão correlativa das subjugações/sujeições --, no desenvolvimento das - comunicações e confraternizações, no pleno emprego das qualidades estratégicas, - inventivas, criativas, ainda totalmente inibidas ou por desbastar na nossa - sociedade. - - -- 368-369 - -## Bios - -* Ser vivo gerador de acaso; liberdade, criatividade e eventualidade, 409. -* Autopoiese, 417. - -Trechos: - - Vimos que, para lá de um certo número de interações e de indeterdependências, - para lá de um certo grau de complicação, se torna impossível calcular e - conhecer os processos de um fenômeno. Niels Bohr formulara-o à sua maneira: - "É impossível efetuar medidas físicas e químicas completas sobre um - organismo sem matá-lo". - - -- 421 - -## Complexidade, lógica e contradição - -* Simples, simplicidade, simplificação na ciência, 432. - -Trechos: - - O pensamento complexo, animado pela dupla exigência de completude (não a - "totalidade", mas a não-mutilação) e de coesão, conduz num determinado momento - a uma brecha lógica: a contradição. Será necessário que um diktat lógico - exterior e abstrato condene a exigência de lógica interior que conduziu à - contradição? Não será antes necessário imaginar que o surgimento da contradição - opera a abertura súbita de uma cratera no discurso sob o impulso das camadas - profundas do real? - - -- 425 - - A lógica aristotélica corresponde à igualdade estática imediata das "coisas", - objetos sólidos como pedra ou mesa, recortados ou isolados no tempo e no - ambiente. O princípio do terceiro excluído e o princípio de identidade - concernem sistemas "fechados", que definimos não só sem referência ao seu - ambiente, mas também sem ter em conta o segundo princípio da termodinâmica, que - constitui um princípio de transformação interna dos sistemas fechados. Assim, - logo que se trata de sistema aberto, e singularmente de vida, "o princípio do - terceiro excluído de identidade define um ser empobrecido, separado entre meio - e indivíduo" (Simondon, 1964, p.17). - - Embora insuficientes para caracterizar as entidades complexas, esta lógica - permite-nos arrancar os seres ou objetos à confusão, identificá-los num - primeiro grau, e é necessária às operações seqüenciais do raciocínio - complexo. Repetimos: não só o raciocínio complexo deve ser coerente mas é a - sua própria coerência que conduz às contradições. - - Quando o pensamento simplificador encontra uma contradição que não pode ser - superada, volta atrás exclamando "erro'. O pensamento complexo aceita o - desafio das contradições. Não poderia ser, como a dialética, a "superação" - (Aufhebung) das contradições. É a sua desocultação, a sua evidenciação, - e recorre ao corpo-a-corpo com a contradição. - - [segue uma bela descrição sobre o surgimento de uma contradição] - - Daí em diante importa inverter o modo de pensamento simplificador que, - postulando a adequação absoluta entre a lógica e o real, opera de fato - a redução "idealista" do real à lógica. Temos de reconhecer que real - e lógico não se identificam totalmente. - - [...] - - Para o conhecimento complexo, a contradição não é somente o sinal de um absurdo - de pensamento. Pode tornar-se o detector de camadas profundas do real. - Constitui então já não o detector do erro e do falso mas o indício e o anúncio - do verdadeiro. - - [prossegue com uma bela fala sobre a lógica ilógica do vivo e o enriquecimento - do princípio de incerteza] - - [...] - - O pensamento não serve à lógica: serve-se dela. O problema é: como servir-se? - - -- 427-429 - -## Complexidade e simplicidade - -* Robotização do ser vivo pelo pensamento simplificador, 434. -* Marxismo, sistemismo e simplificação, 435. - -Trechos: - - A complexidade é a união da simplificação e da complexidade. - - [...] - - O pensamento complexo deve lutar contra a simplificação, utilizando-a - necessariamente. Existe sempre um duplo jogo no conhecimento complexo: - simplificar ----> complexificar. No duplo jogo, o complexo volta - \ / - ---------<--------´ - - incessantemente como pressão da complexidade real e consciência da - insuficiência dos nossos meios intelectuais diante do real (por isso, - o pensamento complexo é o pensamento modesto que se inclina diante - do impensável). - - -- 432-433 - - O esforço da complexidade é aleatório e difícil. [...] É porque - integra aquilo que desintegra o pensamento que ela vive [a estratégia - do pensamento complexo], como tudo quanto é vivo, à temperatura da - sua própria destruição. [isto é citado novamente na página 438] - - [...] - - A complexidade é um termo-chave. Mas não é uma palavra dominante. - - -- 435 - -## Viver - -* Simmel, 440. -* Simondon, 441. -* Von Neumann, jogo, 446. -* Organ, fervilhar ardentemente, 465. - -Trechos: - - O ser que nasce não pediu para viver, mas logo que nasce, só pede para viver. - Nenhum vivo quis viver, no entanto, todo o vivo quer viver. - - -- 438 - - A definição de Bichat: "A vida é o conjunto das funções que resistem à morte." - - [...] - - Atlan formula o princípio complementar e antagônico do princípio de Bichat: - "A vida é o conjunto das funções capazes de utilizar a morte" - (Atlan, 1979, p. 278) - - -- 439-440 - - Ninguém nasce só. Ninguém está só no mundo, no entanto cada um está só - no mundo. - - -- 442 - - Os destinos são diferentes, desiguais, incomensuráveis, que seria absurdo - hierquizá-lo (sic). Mas certamente existem vidas infernais: parasitas, - subjugadas, subdesenvolvidas, atrofiadas... - - -- 443 - -## Manipulação da vida - - A ação do homem sobre a vida começou desde a pré-história por domesticação, - sujeição, subjugação, e prosseguiu como manipulação através de hibridações - e cruzamentos. A manipulação alcança hoje o santuário dos genes. - - [...] - - Por um lado, há um ganho potencial de complexidade por elevação da produção - industrial do nível do artefato ao da organização viva. Existe redução - potencial do ser vivo ao estatuto do artefato e praticamente transformação - dos seres vivos em máquinas artificiais (já a criação industrial dos - porcinos e bovinos os transforma em puras e simples máquinas de fazer carne). - - Assim, a progressão do industrial tornado vivo corre o risco de ser uma - regressão da vida, que vai se tornando industrial, tornando-se a - bioindústria o prolongamento tecnossociológico da manipulação experimental - que trata os seres celulares e pluricelulares como agrupamentos de - peças soltas. - - Mais profunda e amplamente, está aberta a porta para a manipulação ilimitada - sobre a vida. Encontramo-nos no momento de uma tomada de poder decisiva. - Podemos imaginar, como me indica Gaston Richard, que os microorganismos - podem efetuar todas as operações naturais necessárias à nossa vida, inclusive - a fotossíntese, tornando assim obsoletas a nossa preocupação de preservar - ecossistemas: de onde a possibilidade de liquidação geral de todas as - espécies vegetais ou animais, deixando frente a frente, no Planeta Terra, - o homo e a Escherichia coli. - - [...] - - O novo poder sobre a vida será tão fundamentalmente controlador e tão - fundamentalmente incontrolador quanto foi a tomada de poder sobre a energia - atômica há quarenta anos. E concerne, mais íntima e fundamentalmente ainda, o - poder sobre o homem. - - -- 469-470 diff --git a/books/filosofia/metodo/3.md b/books/filosofia/metodo/3.md deleted file mode 100644 index 8f2960e..0000000 --- a/books/filosofia/metodo/3.md +++ /dev/null @@ -1,140 +0,0 @@ -[[!meta title="O Método - Volume III"]] - -[[!toc levels=4]] - -## Geral - -* Arqui-racionalidade, 59. -* Simplificar <-> complexificar, 72-73. -* Techne, 196. -* Gênio, 204. -* Tomada de consciência, 212. -* Auto-análise, 216 (mas não só nessa página). -* Idealismo: tomar a idéia pelo real, 248. -* Racionalização: encerrar o real num sistema coerente, 248. -* Auto-engano (self-deception), 249. - -## Paradoxo essencial do cérebro-espírito - - O que é um espírito que pode conceber o cérebro que o produz, e o que é um - cérebro que pode produzir um espírito que o concebe? - - -- 84 - -## Princípio hologramático, holográfico - - Daí a riqueza das organizações hologramáticas: - - a) as partes podem ser singulares ou originais, embora dispondo de aspectos - gerais e genéricos da organização do todo; - - b) as partes podem ser dotadas de autonomia relativa; - - c) podem estabelecer comunicações entre elas e realizar trocas organizadoras; - - d) podem ser eventualmente capazes de regenerar o todo; - - No universo vivo, o princípio hologramático é o princípio essencial das - organizações policelulares, vegetais e animais; cada célula permanece singular, - justamente porque, controlada pela organização do todo (ela mesma produzida - pelas interações entre células), uma pequena parte da informação genética nela - contida se exprime; mas ela permanece ao mesmo tempo portadora das - virtualidades do todo, o que poderia, eventualmente, atualizar-se a partir - delas; assim, seria possível reproduzir por clonagem o ser inteiro a partir de - uma célula mesmo extremamente especializada ou periférica do organismo. - - -- 115 - -## Concepção: dialógica da analógica <-> lógica (digital) - - As analogias organizadoras permitem a formação de homologias que suscitam - princípios organizadores. O raciocínio por analogia faz logo parte do caminho - que leva à modelização e à formalização, mas sob a condição de obedecer à - dialógica do analógico, do lógico e do empírico, ou seja, ao controle da - verificação dedutiva e da verificação empírica. Assim, constitui-se uma onte do - concreto ao abstrato e do abstrato ao concreto através da qual se tece e se - cria a __concepção__, insto é, um novo modo de organizar a experiência e de - imaginar o possível. Em consequência, reencontramos, no próprio procedimento - científico, mas de explícito, razoável e consciente, os métodos de - conhecimentos por isomorfismo, homeomorfismo e homologia que o aparelho - cognitivo utiliza espontânea e inconscientemente no conhecimento perceptivo e - discursivo. - - -- 157 - - A analogica é iniciadora, inovadora (Peirce indicou que a inovação jorra quase - sempre da analogia), inclusive na invenção científica. Alimenta uma ligação - entre concreto e abstrato (via isomorfismos, tipologias, homologias) e entre - imaginário e real (via metáfora). Essas pontes, como já indicamos, estimulam - e provocam a __concepção__, isto é, a formação de novos modos de organização - do conhecimento e do pensamento. - - -- 158 - -## Inteligência artificial - - No estádio evolutivo atual, o conhecimento por computador continua um apêndice - operacional do conhecimento humano; ainda não se trata do primeiro modelo de - um conhecimento sobre-humano. Não é proibido imaginar, para o futuro, máquinas - cognoscentes, artificiais no começo, e depois auto-organizativas e dotadas - de individualidade. Mas elas se tornariam então novos seres-sujeito que gozariam - e sofreriam com os seus conhecimentos, produziriam, talvez, os seus próprios - mitos e poderiam então manipular as coisas ou mesmo os seres humanos. - - -- 226 - -## Limites do conhecimento - - O problema da caverna permanece. O problema da câmara fechada continua. Mas - sabemos doravante que a caverna nos permite ver sob a forma de sombras o que, - fora, nos cegaria; a câmara fechada, onde o cérebro permanece encerrado, - permite ao espírito abrir-se ao mundo sem se aniquilar. - - -- 240 - - Nessas condições, somos aparentemente conduzidos à definição tradicional da - verdade: a adequação do espírito à coisa. Mas é preciso complexificar: - como a coisa é co-elaborada pelo aparelho cognitivo, vale mais conceber o - conhecimento como adequação de uma organização cognitiva (representação, - idéia, enunciado, discurso, teoria) a uma situação ou organização fenomenal. - - Tal adequaçã não é evidentemente a de um "reflexo", mas o fruto de uma - reprodução mental. Tal reprodução não constitui a cópia, mas a _simulação_, - nos modos analógicos/homológicos, dos objeto, situações, fenômenos, - comportamentos, organizações. - - Assim, a representação e a teoria podem ser consideradas, cada uma do seu - jeito, como uma reconstituição simuladora, uma concreta/singular, a outra - abstrata/generalizante. - - [...] - - Em nenhum caso, o conhecimento esgotaria o fenômeno a ser conhecido - e a verdade total, exaustiva ou radical é impossível. Toda pretensão - à totalidade ou ao fundamento resulta em não-verdade. - - -- 244 - - Acrescente-se que a operacionalidade lógica, limitada aos enunciados - segmentados, encontra limite no aparecimento do nó complexo dos problemas e ao - atingir as camadas primordiais da realidade. - - [...] - - Acabamos pois além do realismo "ingênuo" e do realismo "crítico", além do - idealismo clássico e do criticismo kantiano, num _realismo relacional, - relativo e múltiplo_. A _relacionalidade_ vem da relatividade dos meios - de conhecimento e da relatividade da realidade cognoscível. A multiplicidade - diz respeito à multiplicidade dos níveis de realidade e, talvez, à - multiplicidade das realidades. Segundo esse realismo relativo, relacional - e múltiplo, o mundo fenomenal é real, mas relativamente real, e devemos mesmo - relativizar a nossa noção de realidade admitindo uma irrealidade interna - a ela. Esse realismo reconhece os limites do cognoscível e sabe que o - mistério do real não se esgota de forma alguma no conhecimento. - - -- 245 - - Pensa por ti mesmo, e o método te ajudará. - - -- 251 - diff --git a/books/filosofia/metodo/4.md b/books/filosofia/metodo/4.md deleted file mode 100644 index df491ab..0000000 --- a/books/filosofia/metodo/4.md +++ /dev/null @@ -1,164 +0,0 @@ -[[!meta title="O Método - Volume IV"]] - -[[!toc levels=4]] - -## Geral - -* Cultura como um megacomputador, 20. -* Pensamento e efervescência culturais na temperatura de sua própria destruição, 98. -* Metanível, metalógica, 248. - -## Cultura - - Assim, a cultura não é nem "superestrutura" nem "infra-estrutura", termos - impróprios em uma organização recursiva onde o que é produzido e gerado - torna-se produtor e gerador daquilo que o produz ou gera. - - [...] - - Se a cultura contém um saber coletivo acumulado em memória social, se é - portadora de princípios, modelos, esquemas de conhecimento, se gera uma visão - de mundo, se a linguagem e o mito são partes constitutivas da cultura, então a - _cultura não comporta somente uma dimensão cognitiva: é uma máquina cognitiva - cuja práxis é cognitiva_. - - -- 19 - - Nesse sentido, poder-se-ia dizer metaforicamente que a cultura de uma sociedade - é como uma espécie de megacomputador complexo que memoriza todos os dados - cognitivos e, portadora de quase-programas, prescreve as normas práticas, - éticas, políticas dessa sociedade. - - -- 20 - -## Efervescência cultural - - Por um lado, o imprinting, a normalização, a invariância, a reprodução. - Mas, por outro lado, os enfraquecimentos locais do imprinting, as brechas na - normalização, o surgimento de desvios, a evolução dos conhecimentos, as modificações - nas estruturas de reprodução. - - [...] - - Para tratar desses problemas, é preciso, antes de tudo, perguntar quais são as - possibilidades de enfraquecimento dos três níveis deterministas do _imprinting_ - cognitivo (paradigmas, doutrinas, estereótipos), bem como sobre as possibilidades - de falha ou atenuação da normalização. - - Em nossa opinião, são os seguintes: - - - a existência de vida cultural e intelectual dialógica; - - o "calor" cultural; - - a possibilidade de expressão de desvios. - - -- 33 - -## Conhecimento do conhecimento - - Assim, desembocamos em uma situação cognitiva ao mesmo tempo emaranhada e - circular: cada instância (sociologia, ciência, epistemologia) necessita das - outras para conhecer-se e legitimar-se e o círculo que poderia então se - constituir entre essas instâncias, cada uma dependendo da outra e recorrendo à - outra, constituiria então o metaponto de vista ao qual cada uma tentaria - referir-se. Aqui, só estamos no começo da elaboração do _grande anel cujo - circuito produtivo constituiria "o conhecimento do conhecimento_, isto é, o - conjunto complexo e rotativo dos metapontos de vista sobre o conhecimento; mas, - desde já, o anel restrito esboçado aqui nos permite entrever "o grade anel" - epistemológico ("o anel dos anéis"). - - -- 115 - -## O futuro do conhecimento - - Além disso, podemos perguntar se, na aurora do novo milênio, o próprio destino do - conhecimento humano não estará sendo novamente posto em jogo. - - Retomemos a metáfora do Grande Computador. - - Há, nas sociedades modernas e democráticas, uma relação extremamente complexa e - recursiva entre o Grande Computador e os indivíduos; estes não estão apenas - submetidos ao conhecimento próprio à sua cultura, mas são também sujeitos - cognoscíveis, cuja consciência individual está dotada de uma competência de princípio - para examinar idéias, decidir sobre a verdade e julgar problemas éticos correspondentes. - - Mas, alguma coisa está modificando-se no próprio modo das interações cognitivas que - tecem as relações sociais. O que chamamos de informática é, na realidade, a primeira - etapa, ainda bárbara e grosseira, de um sistema de computação/informação/comunicação - artificial que poderá revolucionar as relações do espírito com o cérebro, da sociedade - com os seus membros, do Estado com o indivíduo. Já se formam apêndices cerebrais artificiais, - coletivos ou pessoais (os computadores individuais) que dialogam com nossos espíritos, - comunicam-se uns com os outros e articulam-se cada vez mais no tecido social. - Estamos na aurora de um formidável desenvolvimento da cerebralidade artificial em redes e, - nesse sentido, estamos também no alvorecer de uma nova idade do conhecimento. - - Os processos em curso são profundamente ambivalentes e as perspectivas de futuro, incertas. - - Já vimos (na introdução de _La Méthode_ 1, p. 12-13) o problema do despojamento do direito - individual para integrar e refletir o conhecimento em proveito dos especialistas, - experts e bancos de dados. - - Acrescentemos: os desenvolvimentos das redes neurocerebrais artificiais, com seus - desdobramentos previsíveis (novas gerações de computadores "neuronais" aptos eventualmente - a reorganizar as regras dos programas, extensão e generalização do tecido informático - poli-tele-conectado), realizam-se segundo duas vias divergentes: - - - uma vai no sentido do desenvolvimento dos poderes individuais do conhecimento (poderes - operacionais, lógicos, heurísticos, acesso às fontes de dados, etc.) e das possibilidades - individuais de expressão, de transmissão, de diálogo; - - - a outra vai no sentido do desenvolvimento dos poderes de controle dos indivíduos pelas - administrações e pelo Estado. - - Ao mesmo tempo, o progresso no conhecimento bio-químico-físico do cérebro permitirá - a modificiação, via intervenções moleculares ou outras, dos processos mentais. - - Daí, ainda uma ambivalência no desenvolvimento desses poderes: - - - por um lado, o espírito individual poderia intervir no seu próprio cérebro para - modificar, enriquecer, exaltar os seus estados de consciência. - - - por outro lado, um novo poder totalitário poderia subjugar, _via_ manipulações - neurocerebrais, incluindo a interpretação dos dados sensoriais, a provocação ou - inibição das emoções, a elaboração dos projetos para o futuro. - - Assim, por um lado, o espírito poderia agir sobre o cérebro para desenvolver-se. - Por outro, a organização social poderia agir sobre o cérebro para controlar o - espírito. Por um lado, abrir-se-ia a possibilidade de dar vida aos "Mozart assassinados". - Por outro, afirmar-se-ia o reino do _Big Brother_. - - -- 121-123 - -## Noosfera - -Popper já havia dividido o universo humano em três mundos: - - 1. O mundo das coisas materiais exteriores. - 2. O mundo das experiências vividas. - 3. O mundo constituído pelas coisas do espírito, produtos culturais, linguagens, noções, - teorias, inclusive os conhecimento objetivos. Trata-se, de fato, de uma _noosfera_, - conforme o termo forjardo Teilhard de Chardin nos anos 20. Popper denominou-o - o "mundo três". - - [...] - - Pierre Auger chegou à idéia não tanto de um "terceiro mundo", no sentido de Popper, mas - de um terceiro reino, no sentido biológico do termo. Esse novo reino é "constituído por - organismos bem definidos, as idéias, que se reproduzem por multiplicações idênticas - nos meios constituídos pelos cérebros humanos, graças às reservas de ordem aí disponíveis". - As idéias são dotadas de vida própria porque dispõem, como os vírus, em um meio (cultural/cerebral) - favorável, da capacidade de autonutrição e de auto-reprodução. Assim, os cérebros humanos - e, acrescentemos, as culturas formam os ecossistemas do mundo das idéias. Auger constata - muito bem que não apenas as idéias, mas também os mitos e os deuses, vivem uma vida própria - no terceiro reino. - - -- 134-136 - - De minha parte, [...] convencido de que esse mundo certamente é um produto, mas um - produto recursivamente necessário à produção de seu próprio produtor antropossocial, - fui sensibilizado pela conepção de Auger/Monod que considerava a noosfera não mais como - um mundo abstrato de objetos ideias, mas como um mundo fervilhante de seres dispondo - de algumas das características essenciais dos seres biológicos; fui assim estimulado - a explorar o problema da autonomia relativa e da relação complexa (da simbiose à - exploração mútua) entre esses seres de espírito e os seres humanos. - - -- 136-137 diff --git a/books/filosofia/metodo/5.md b/books/filosofia/metodo/5.md deleted file mode 100644 index ea0835e..0000000 --- a/books/filosofia/metodo/5.md +++ /dev/null @@ -1,24 +0,0 @@ -[[!meta title="O Método - Volume V"]] - -[[!toc levels=4]] - -## Geral - -* Tecnologia, 213. -* Progresso e história linear, 217. -* Contracorrentes de defesa contra a dominação, 231. -* Convergência álter-globalização, 234. -* Liberdades do espírito, 282. - -## Liberdade - - Como, justamente, dizia Rivarol: "O mais difícil, num período conturbado não é - cumprir o dever, mas conhecê-lo". Que significa a liberdade quando a consciência - está turva e extraviada? A aventura da liberdade é um "jogo engraçado", um jogo - perigoso. Vemos aqui que a liberdade corre o mesmo risco que a verdade: o - risco do erro. - - Evidente que é mais fácil, 30 anos depois, dissipada a confusão ver claro onde - tantos espíritos se perderam. - - -- 277 diff --git a/books/filosofia/metodo/6.md b/books/filosofia/metodo/6.md deleted file mode 100644 index 61a3ee4..0000000 --- a/books/filosofia/metodo/6.md +++ /dev/null @@ -1,66 +0,0 @@ -[[!meta title="O Método - Volume VI"]] - -[[!toc levels=4]] - -## Geral - -* Eugenia, eliminação de desviantes e dissidentes, 76. -* Crises, novas soluções, soluções neuróticas e patológicas, 85. -* Quadro da auto-ética, 93. -* Definição de antropoética, 159. -* Os nove mandamentos da antropoética, 163. -* Bem viver, 171. -* Metamorfose, 179. -* "Tudo o que não regenera, degenera" (pág. 197 e ao longo do livro). - -## Amor - - O amor é a expressão superior da ética. Segundo Tagore, "o amor verdadeiro exclui - a tirania, assim como a hierarquia". - - -- 37 - -## Compreensão - - Trata-se de um erro intelectual reduzir um todo complexo a um único dos seus - elementos e esse erro se tornsa pior em ética do que em ciência. A redução - impede a compreensão do outro. Hegel sintetizou a redução na já citada frase - sobre o assassino. Reduzir a mentiroso aquele que não tem consciência de estar - mentindo para si mesmo significs inventar um culpado. Enclausurar para sempre - na culpabilidade aqeuele que cometeu um erro de julgamento político numa época - conturbada faz parte infelizmente da banalidade da incompreensão, que produzir - um consumo enorme de culpados. As disputas ideológicas e políticas - transformam-se em ódio e desprezo pelo outro por meio da redução e da - identificação de uma pessoa com idéias consideradas nocivas. - - O importante é não reduzir o ser humano à sua ideologia nem às convicções - culturalmente nele gravadas. Assim, não se pode reduzir Aristóteles ou Platão, - ou tantos outros seres, de resto, sensíveis, ao fato de que aceitavam a - escravidão como coisa natural. Mas não se pode esquecer isso, o que nos ajuda a - compreender que mesmo nos mais belos espíritos existem manchas de desumanidade - e de incompreensão. - - -- 114 - - Ora, não há hierarquia mas antes permutações rotativas entre as três instâncias - cerebrais, ou seja, razão/afetividade/pulsão. Conforme os indivíduos e os - momentos, há dominação de uma instância sobre as outras, o que indica não - apenas a fragilidade da racionalidade, mas também que a noção de - responsabilidade plena e lúcida só tem sentido para um ser controlado em - permanência pela sua inteligência racional. - - Além disso, todo indivíduo tem em potencial uma multipersonalidade; a - duplicação da personalidade, no seu aspecto patológico extremo, só faz revelar - um fenômeno normal pelo qual nossa personalidade se cristaliza diferentemente - não apenas em função dos papéis sociais que desempenhamos, mas conforme a ira, - o ódio, a ternura, o amor, tudo o que nos leva realmente a passar de uma - personalidade para outra, modificando as relações entre razão, afetividade e - pulsão. - - -- 114-115 - -## A modéstia ética - - Prega o abandono de todo sonho de controle (inclusive do seu controle). - - -- 197 diff --git a/books/filosofia/metodo/tetragrama.dot b/books/filosofia/metodo/tetragrama.dot deleted file mode 100644 index 937e2ed..0000000 --- a/books/filosofia/metodo/tetragrama.dot +++ /dev/null @@ -1,8 +0,0 @@ -graph { - ordem -- desordem; - ordem -- organizacao; - ordem -- interacoes; - desordem -- interacoes; - desordem -- organizacao; - organizacao -- interacoes -} diff --git a/books/filosofia/metodo/tetragrama.svg b/books/filosofia/metodo/tetragrama.svg deleted file mode 100644 index fe4c6ed..0000000 --- a/books/filosofia/metodo/tetragrama.svg +++ /dev/null @@ -1,57 +0,0 @@ - - - - - - -%3 - - -ordem - -ordem - - -desordem - -desordem - - -ordem--desordem - - - -organizacao - -organizacao - - -ordem--organizacao - - - -interacoes - -interacoes - - -ordem--interacoes - - - -desordem--organizacao - - - -desordem--interacoes - - - -organizacao--interacoes - - - - -- cgit v1.2.3